Fidel Castro, a Revolução Cubana e o Maranhão político de 1959

 

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Fidel Castro teve influência forte e decisiva sobre a geração que começava na política em 1959 no Maranhão, quando as carta no estado eram dadas pelo victorinismo

Fidel Castro e a Revolução Cubana mexeram fortemente com o mundo. Tornaram-se, nas quatro décadas que restaram do século XX, tema dominante e recorrente na política mundial, e invadiram os primeiros 16 anos deste século, cerca de 5.840 mil dias, já desgastados, sem os apelos revolucionários  de antes, mas importantes o suficiente para produzir o que mais produziram em mais de meio século: debate – travado em conversas pessoais, em rodas ativas, salas de aulas, bancas universitárias, mesas redondas, seminários, congressos temáticos, parlamentos de todos os níveis, diálogos entre chanceleres, primeiros-ministros, reis e papas, sempre com o duro choque de posições apaixonadamente contrárias e sem qualquer possibilidade de convergência. Seus impactos alcançaram rigorosamente todos os recantos dos cinco continentes, causaram fortes rejeições, mas não há dúvidas que o seu avassalador poder de sedução contagiou a grande maioria dos seus contemporâneos. Fidel Castro e a Revolução Cubana entraram na vida do planeta quando o Maranhão um estado primitivo, oligárquico, comandado na prática com mão de ferro pelo lendário e também icônico Victorino Freire e tendo em São Luís a sua Havana. Era como se a ação revolucionária dos jovens cubanos estivesse um século à frente e Fidel Castro fosse algo possível somente décadas depois.

Em 1959, quando, à frente do seu exército de guerrilheiros, Fidel Castro consumou a tomada do poder em Cuba e ganhavam os corações dos cubanos, fazendo se roerem de inveja revolucionários do mundo inteiro,  a vida no Maranhão continuava sem alteração, com o puxa-encolhe da política local muitas vezes fomentado pelo próprio Victorino Freire. Mesmo assim, vozes firmes e corajosas bradavam na planície, eram ouvidas e abafadas quando convinha, não geravam consequências, mas não se entregavam. Maria Aragão, que logo se apaixonou pelo movimento dos cubanos, era na época uma médica de 29 anos, militante clandestina e tenaz do PCB, e que entre xingamentos e palavras carinhosas, alimentava o tom revolucionário que trouxera dos embates no Estado Novo varguista. Manoel da Conceição agricultor que logo de tornaria a expressão maior das Ligas Camponesas no Maranhão, já se batia contra latifundiários. O grande poeta Ferreira Gullar, que participou de todos os movimentos de esquerda no Rio de Janeiro naquele período, curiosamente não publicou nenhum poema naquele ano, limitando sua produção a um cordel: “João Boa Morte. Cabra Marcado para Morrer”.

No histórico 1959 o Maranhão era governado pelo respeitado médico Matos Carvalho (PSD), um moderado que não gostava de briga, mas que tinha como vice um brigão por natureza e temperamento: o jovem e destemido engenheiro caxiense Alexandre Costa. Garantido pelo manto protetor do victorinismo, esse governo tinha base forte no Senado e na Câmara Federal. E justo naquele ano, a situação era tão tranquila no Maranhão que, enquanto cubanos de todas as regiões, cores, religiões e credos políticos engrossavam as fileiras da Revolução sob a liderança de Fidel Castro, as três vagas de senador foram ocupadas por Victorino Freire, Alberto Duailide, Eugênio Barros, Públio Melo (este suplemente de Assis Chateaubriand, eleito em 55), Remi Archer e Sebastião Archer,que foi governador de 1947 a 1951.

Naquele emblemático ano de 1959, o melhor da geração política maranhense de então, que daria as cartas no estado nos próximos tempos encontrava-se na Câmara Federal. O que mais chama atenção é que dos 15 deputados federais, nada menos que 12 eram filiados ao PSD e estavam politicamente alinhados ao infalível senador Victorino Freire. A saber: o ex-governador Aquiles Lisboa, o futuro governador Newton Belo, Miguel Bahury, a lendária raposa Lister Caldas, o diplomata José Rio (que só voltou ao Maranhão para ser chefe da Casa Civil no do Governo João Alberto em 1990), Henrique La Rocque (cuja maciez o transformou num politico habilíssimo), Eurico Ribeiro (que por caminhos de crise chegou a ser governador por um tempo), Clodomir Milet (o cérebro da reforma eleitoral que extirpou milhares de fantasmas com direito a voto), Cid Carvalho (gênio político que seria cassado duas vezes, uma pelos militares em 1966, e outra na CPI dos Anões em 1992, quando era homem forte do PMDB e foi flagrado fazendo corrupção como relator do Orçamento), Cesário Coimbra (médico e militante trabalhista que abraçou o PTB e morreu íntegro), Renato Archer (oficial da Aeronáutica de porte aristocrático, que seria cassado pelos militares, perdeu a disputa do Governo para Luiz Rocha em 82, virou ministro de Sarney em 85 e depois se perdeu no tempo e no espaço) e Jorge Dino (médico respeitado, que foi vice e sucedeu a José Sarney no Governo do Estado em 1970).

Os três não subordinados a Victorino Freire eram exatamente José Sarney, e Pedro Braga ambos da UDN, e Neiva Moreira, na época sem partido, mas sabidamente partidário entusiasmado de Fidel Castro e da Revolução Cubana, que defendeu até morrer.

Como contam os fatos, só José Sarney sobreviveu a Fidel Castro. E a Revolução Cubana está presente no Maranhão pela ação dos mais de 800 médicos que hoje trabalham no estado trazidos pelo programa “Mais Médicos”.

PONTO & CONTRAPONTO

Sarney e Fidel, amigos, amigos; Revolução à parte
Fidel Castro e José Sarney em Caracas, Venezuela
Fidel Castro e José Sarney em Caracas, Venezuela: relações cordiais e amigas

José Sarney sempre demonstrou forte simpatia por Fidel Castro, que sempre fez o mesmo na sua direção, mas nunca conseguiu esconder as suas restrições políticas em relação à Revolução Cubana, apesar de aqui e ali reconhecer os avanços dos cubanos em educação e saúde. Prefere falar do aspecto romântico do que entrar na crueza revolucionária. Em 1959, Sarney exercia seu primeiro mandato de deputado federal como membro da filiado à UDN, partido de centro-direita e liberal, à frente do qual lideraria, em 1966, o movimento que demoliria o victorinismo nas urnas e daria novos rumos ao Maranhão semi-feudal de então. Como deputado, como seus contemporâneos, foi simpático no primeiro momento, mas mudo em 62 quando Fidel anunciou a guinada para o comunismo. O destino, porém, havia determinado que em 1986, duas décadas depois, caberia exatamente ao ex-udenista e agora pemedebista José Sarney, na condição de presidente da República que comandou a transição da ditadura para a democracia, restaurasse as relações diplomáticas entre o Brasil e Cuba. O reatamento aproximou Sarney e Fidel, que se encontraram várias vezes e tiveram várias e longas conversas. Tanto que Fidel sempre se referiu o líder maranhense como “amigo”. Ontem, ao tomar conhecimento da morte de Fidel Castro, José Sarney divulgou nota em que se refere ao líder cubano como um mito, com quem sempre teve relações cordiais e amigas.

Jackson: fã de Fidel e entusiasta da Revolução

Um dos políticos maranhenses mais identificados com Fidel Castro e com a Revolução Cubana estava no Rio de Janeiro estudando medicina em 1959, quando o movimento triunfou em Havana, foi Jackson Lago, que contava então com 25 anos. Socialista por convicção, Jackson Lago naquele ano militava em movimentos da esquerda moderada e desde logo estabeleceu contatos com agentes revolucionários. Sua admiração pelo processo revolucionário só aumentou com o tempo, apesar das contradições que o movimento começava mostrar, como os fuzilamentos e a guinada para o comunismo diante da tentativa dos Estrados Unidos de interferirem para salvar os bens norte-americanos confiscados. Nos anos 80 do século passado, encantado com os avanços na área de saúde, Jackson Lago mandou o filho de nome russo, Igor Lago, estudar Medicina em Cuba, Jackson Lago também apoiou a vinda para Caxias dos primeiros médicos cubanos, nos anos 90, criticando duramente a reação do Conselho Regional de Medicina na época, que pediu e conseguiu a “deportação” dos mesmos. Quando governador, Jackson Lago fez vários gestos em relação a Cuba, provocou uma visita do embaixador cubano ao Maranhão e, segundo informações soltas, estaria se preparando para ir a Cuba em busca de convênios e intercâmbios, principalmente na área de saúde. Morreu mantendo fidelidade a Fidel Castro e à Revolução Cubana e certamente lamentando não tê-la trazido para o Maranhão.

 

São Luís, 26 de Novembro de 2016.

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