O Palácio dos Leões viveu ontem um momento de forte simbolismo político no ato em que o governador Flávio Dino (PCdoB) e o presidente da Assembleia Legislativa, deputado Othelino Neto (PCdoB), entregaram, respectivamente, as Medalhas da Ordem Timbira e do Mérito Legislativo Manoel Beckman ao presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz. O ato deve entrar para a História como um dos eventos marcantes do momento político por que passam o Maranhão e o Brasil. Ao conceder a honraria, o governador alcançou dois objetivos: primeiro, homenageou o presidente de uma das instituições mais importantes do Brasil, que tem papel fundamental na luta contra o arbítrio e na construção e consolidação do estado democrático de direito e à qual pertence como advogado; e segundo, deu uma contundente estocada política no presidente Jair Bolsonaro (PSL), em resposta à agressão ao presidente da OAB e sua família como uma inacreditável grosseria.
No dia 29 de julho, irritado com a atuação da OAB em defesa dos direitos do advogado que defendia Adélio Bispo, autor da facada que recebeu durante a campanha eleitoral, o presidente Jair Bolsonaro surpreendeu o mundo com a dar seguinte declaração a jornalistas: “Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, eu conto. Ele não vai querer ouvir a verdade. Eu conto para ele”. O pai de Felipe, Fernando Augusto Santa Cruz, um jovem advogado de 24 anos, recém-casado e militante político foi assassinado pela ditadura em fevereiro de 1974, depois de ter sido preso por agentes do Doi-Codi, no Rio de Janeiro. Os militares negaram o assassinato, e Augusto Santa Cruz foi tido como “desaparecido”, já que seu corpo não foi encontrado.
Com a declaração, Jair Bolsonaro escandalizou o Brasil e o mundo civilizado. Como um presidente da República declara que tem conhecimento de um assassinato político e não denuncia? Mesmo sendo defensor da ditadura militar e declaradamente favorável ao assassinato e à tortura de adversários daquele regime, o fato de Jair Bolsonaro afirmar que sabe como o pai de Santa Cruz foi morto o coloca no mínimo como cumplice. Se estiver mentindo, pode até ter seu mandato cassado, pois a Constituição brasileira reza que o presidente da República não pode mentir, sob pena de perder o mandato.
Em meio ao impacto das agressivas declarações de Jair Bolsonaro atacando o dirigente da OAB, o governador Flávio Dino, respaldado na condição de chefe de Estado, advogado e ex-juiz federal, criticou duramente a postura e a irracionalidade política e institucional do presidente da República, e fez uma contundente defesa da Ordem e do seu dirigente. No mesmo dia, anunciou a concessão, por decreto, da comenda à Felipe Santa Cruz. O presidente da Assembleia Legislativa, Othelino Neto, fez o mesmo. Convidado a participar de um evento sobre Direito em São Luís, ontem, o presidente da OAB foi ao Palácio dos Leões receber a dupla homenagem, uma das mãos do governador Flávio Dino e a outra das do presidente Othelino Neto.
No ato, o governador Flávio Dino justificou a homenagem: “A OAB é uma entidade fundamental para o Brasil e para o nosso estado, na medida em que é guardiã da Constituição, da legalidade, dos direitos da população, além de ser a entidade representativa dos advogados. Em razão desta importância da OAB que nós estamos fazendo, essa sessão em que, duplamente, ocorre a homenagem ao presidente nacional, como apoio, incentivo e estímulo para que ele continue exercendo esse papel de porta voz da cidadania, da defesa e democracia”. E completou: “É hora de os democratas desse país estarem unidos. É hora dos democratas brasileiros acenderam a luz amarela”. Por sua vez, o presidente da Assembleia Legislativa destacou: “É um reconhecimento à OAB e ao trabalho que Felipe Santa Cruz faz à frente da instituição, em defesa do estado democrático de direito e em combate às arbitrariedades cometidas pelo Governo Federal, protestando a todo e qualquer ataque a direitos duramente conquistados pelo povo brasileiro”.
Felipe Santa Cruz agradeceu as homenagens reafirmando o compromisso de seguir trilhando na luta pelos direitos individuais e coletivos dos brasileiros: “Recebo não como homenagem a mim, mas como uma homenagem à advocacia brasileira e suas tradições, estou muito feliz e agradeço demais aos dirigentes e líderes do Maranhão, e ao povo deste estado tão generoso e importante para a brasilidade”.
Nenhum dos secretários, magistrados, deputados e advogados presentes ao ato duvidou que as palavras pronunciadas no Salão de Atos do Palácio dos Leões ecoaram fortemente no Palácio da Alvorada, onde o presidente Jair Bolsonaro convalesce de mais uma cirurgia decorrente da facada que recebeu de Adélio Bispo.
PONTO & CONTRAPONTO
Câmara ignora decisões do Senado aprova reforma partidária “vingando” Weverton Rocha
Pouco mais de 24 horas depois de ter amargado, no Senado, uma dura derrota como relator do Projeto de Lei nº 2.029/2019, que muda as regras partidárias para as eleições, o senador Weverton Rocha (PDT) saboreou o gosto da “vingança” e foi dormir menos incomodado. É que ontem à noite, numa operação implacável, a Câmara Federal mandou para o espaço as mudanças feitas pelos senadores e aprovou projeto praticamente na versão original. O texto final dado ao projeto é praticamente igual ao contido no relatório feito pelo senador Weverton Rocha e que não encontrou respaldo na grande maioria dos senadores. Indiferente às críticas e pressões externas, os deputados federais aprovaram, por exemplo, o uso de recursos do Fundo Eleitoral (R$ 1,5 bilhão) para pagar advogado que defenda candidato enrolado e comorar imóveis e veículos para os partidos durante a campanha eleitoral; manteve também artigos que, segundo especialistas em contabilidade, abrem brechas para o uso de caixa 2, tendo também prazo mais alongado para prestação de contas. Escalado como relator, o senador Weverton Rocha acatou quase que integralmente o projeto originário da Câmara Federal, foi fortemente pressionado, abriu negociações frenéticas na Casa, e optou por manter seu relatório admitindo a quase integralidade texto. As negociações não progrediram e o Senado aprovou um substitutivo retirando do projeto original tudo o que estava sendo questionado como “retrocesso”, o que deixou o senador maranhense isolado. Ontem, porém, Weverton Rocha foi “vingado” pela Câmara Federal, curando os arranhões políticos que sofrera.
Questão de ordem para retardar o AST confirmou que PT mantém pé atrás com a Base de Alcântara
Uma questão de ordem apresentada pelo deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), de natureza meramente burocrática, com claro objetivo protelatório, por pouco não retardou a tramitação do Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST) firmado por Brasil e Estados Unidos para uso comercial da Base de Alcântara, na Câmara Federal, onde deverá ser votado na próxima semana. O AST, como se sabe, é o documento a partir do qual serão negociados contratos de aluguel da estrutura maranhense para lançamento de veículos espaciais pelos norte-americanos. Essa tem sido a postura do PT em relação à Base de Alcântara desde o início da sua implantação. No seu final, já no início deste século, o Governo FHC negociou o atual AST com os EUA. O PT, que na época tinha uma força excepcional e caminhava para eleger Lula da Silva presidente, fez um escândalo de proporções gigantescas contra o acordo, alegando exatamente que o texto violava a soberania nacional e outros argumentos absolutamente inexistentes. A grita foi tamanha e a pressão de tal monta que o Congresso Nacional acabou engavetando, mergulhando o programa espacial brasileiro num atraso de 14 anos, tempo que durou os Governos Lula e Dilma Rousseff. As negociações entre Brasil e Estados Unidos sobre o uso comercial da Base de Alcântara foram retomadas no Governo Michel Temer, que deixou tudo mastigado de presente para o “estadista” Jair Bolsonaro (PSL) levar os louros. Felizmente, o presidente da Câmara Federal, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), indeferiu a questões de ordem fajuta do petista Arlindo Chinaglia. E o AST será aprovado, apesar de Jair Bolsonaro, e a Base de Alcântara poderá finalmente decolar de vez.
São Luís, 19 de Setembro de 2019.