Esperado como uma fala voltada para agradecimentos no sentido literal, com o imperativo sentimental, com reconstituição de trajetória e outros itens, o discurso do senador Flávio Dino (PSB) ao se despedir do Senado da República e da vida política propriamente dita, foi uma manifestação de estadista, para quem nada em sociedade pode ser feito sem o eixo da política. Visivelmente entristecido por ter de deixar a vida parlamentar, o futuro ministro do Supremo Tribunal Federal fez uma profissão de fé na política, alertando, ao mesmo tempo, para a perda de influência da política no mundo, citando a fragilização da ONU como exemplo. Para ele, não há meio de resolver a crise planetária e os problemas do Brasil fora da política.
Chamando a atenção para o paradoxo de fazer profissão de fé na política no exato momento em que dela se despede para ser um magistrado, o senador alertou: “Nós precisamos de uma política forte. E só teremos uma política forte com políticos credenciados a exercer a liderança que o Brasil exige”. Na sua compreensão, os brasileiros precisam “retomar a ideia de deveres patrióticos e deveres cívicos. Não podemos sucumbir à espetacularização da política”.
E chamou a atenção para o fato de que a política não evolui sem líderes que a conduzam: “Um bom líder político jamais pode ser um mero artefato midiático submetido à lógica dos algorítimos. O bom líder político tem de ter causas que definam o seu lugar”. E foi além ao afirmar: “As soluções não virão por geração espontânea. Só é possível consertar com S concertando com C. Só é possível encontrar caminhos se, e somente se, a política cumprir o seu papel insubstituível”.
Falando para um plenário heterogêneo, onde se encontravam senadores de todas as correntes, inclusive adversárias, simpatizantes, aliados – deputados federais, deputados estaduais, prefeitos maranhenses -, o senador Flávio Dino amarrou: “Encerro o capítulo da política partidária com tranquilidade e com serenidade. Com muita gratidão, mas, claro, com uma nota de lamento. Na medida em que sei bem a centralidade da política, como estou demonstrando ao falar do futuro da nossa pátria no qual tenha um papel modal a política como transformadora de projeto de emancipação. Fiz questão dessa profissão de fé para dizer que no Supremo Tribunal Federal terei coerência com essa visão que aqui manifesto”.
Deixou no ar todos os indícios de que cedo ou tarde estará de volta à arena política na qual foi forjado e da qual não tem como se desvencilhar.
E no fechamento do roteiro cuidadosamente cumprido, o senador dedicou os últimos momentos como político para assumir compromissos como iminente ministro do Supremo Tribunal Federal: “Podem ter certeza da minha mais absoluta deferência aos poderes políticos do Estado. Essa deferência se manifestando pela capacidade de ouvir, de promover o bom diálogo institucional, para que possamos encontrar o modo pelo qual a harmonia entre os Poderes vai se concretizar”.
E num recado direito ao cidadão comum, Flávio Dino traçou o perfil do julgador que será no Supremo Tribunal Federal: “Esperem de mim imparcialidade e isenção. Esperem de mim o cumprimento da Constituição e das leis. Nunca esperem de mim prevaricação. Nunca esperem de mim não cumprir os meus deveres legais, mas sempre agir com leveza no trato, com capacidade de compreender o outro. Porque um bom juiz fala muito pouco”.
E assumiu três compromissos como membro da Corte Suprema: “Agir com respeito à constitucionalidade das leis. Agir com respeito à presunção da legalidade dos atos administrativos. E agir de um modo consentâneo com o princípio da presunção”.
O senador Flávio Dino, que renunciará hoje ao mandato, passando a titularidade para a suplente Ana Paula Lobato (PSB), dedicou a última parte do seu discurso de despedida ao Maranhão: “Termino me dirigindo ao Maranhão, estado que tudo me deu: família, filhos, amigos, sabedoria, estudo, conhecimento, experiência e milhões de votos. O povo do Maranhão nunca me faltou nas minhas eleições. Somando as eleições somam mais de 7 milhões de votos”.
E encerrou externando sua tristeza por deixar a vida pública exatamente tendo de renunciar a um mandato de senador: “Sinto inveja de vocês que vão continuar aqui”.
PONTO & CONTRAPONTO
Afastamento de Nelma Sarney pelo CNJ é outro arranhão grave na imagem do Judiciário maranhense
O Tribunal de Justiça do Maranhão sofreu ontem mais um forte arranhão na sua imagem com a decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de afastar a desembargadora Nelma Sarney das suas funções por dois anos, por favorecimento a um ex-assessor em concurso para cartorário. O juiz Clésio Coelho Cunha, que teria tentado consertar a falcatrua, foi absolvido por falta de provas.
A decisão do CNJ repercutiu fortemente dentro e fora do Poder Judiciário, não só pelo afastamento em si da desembargadora, mas pelo que a punição representa para a instituição, uma vez que três meses e meio atrás a mão pesada do Conselho alcançou os desembargadores Guerreiro Júnior e Bayma Araújo, ambos envolvidos no escandaloso caso do Fórum de Imperatriz
Para quem não lembra, a desembargadora Nelma Sarney foi afastada sob a acusação de favorecer um ex-assessor dela em concurso público para funções cartorárias. Para a maioria dos conselheiros do CNJ, a desembargadora favoreceu efetivamente o apadrinhado. Já em relação ao juiz, o CNJ não encontrou provas de que ele agiu deliberadamente na decisão tomada.
Cunhada do ex-presidente José Sarney (MDB), Nelma Sarney tem um histórico de tropeços na sua trajetória de magistrada, ora sendo acusada de favorecer, ora sendo apontada como alguém que é favorecido. Tentou ser presidente da Corte por três vezes, mas os problemas a tiraram do jogo, só lhe dando a chance de comandar a Corregedoria Geral. Com a decisão do CJN, a desembargadora Nelma Sarney Costa irá para casa.
O afastamento compulsório de um desembargador é a segunda pena mais grave prevista na Lei Orgânica da Magistratura. No caso, a desembargadora Nelma Sarney permanecerá por dois anos longe da Corte, mas com a vantagem de receber seus vencimentos integralmente. Mas é quase certo de que sua carreira na magistratura se encerra neste momento, já que com o desgaste do afastamento e outros processos que a envolvem, dificilmente ela retomará sua trajetória no Poder Judiciário.
Embate entre deputados evidencia clima de tensão na Assembleia Legislativa
Na semana passada, a Coluna previu que, por causa das eleições municipais deste ano, para a escolha de prefeitos e vereadores nos 217 municípios maranhenses, o plenário da Assembleia Legislativa registrará momentos de forte debate e de tensão. E que, por conta dessa “tradição”, a presidente Iracema Vale (PSB), terão muito trabalho pela frente. Ontem mesmo ela teve de fazer a primeira intervenção para evitar o acirramento de um confronto verbal entre os deputados Yglésio Moises (PSB) e Rodrigo Lago (PCdoB).
Na primeira sessão após o longo “recesso” feito por causa do reinado de Momo, o clima de tensão veio à tona, colocando em posição de confronto parlamentar os deputados Yglésio Moisés e Rodrigo Lago. O primeiro, ao fazer uma denúncia sobre suposto esquema de arapongagem contra ele e, possivelmente seus familiares, acusou o PCdoB de estar por trás de uma suposta perseguição. O deputado fez uma série de ilações em relação ao PCdoB, o que deixou indignada a bancada do partido.
Um dos cinco membros da mancada do PCdoB deputado Rodrigo Lago, que é 1º vice-presidente da Assembleia Legislativa, reagiu duro, inclusive tachando o deputado Yglésio Moises de “covarde”, por ele não lhe ter concedido aparte e por haver se retirado do plenário logo após fazer a acusação. Rodrigo Lago avisou que a partir de agora, toda e qualquer acusação ou agressão de Yglésio Moises ao PCdoB “terá resposta imediata e dura”.
Diante da temperatura elevada do embate entre os dois parlamentares, a presidente Iracema Vale (PSB) interveio, em tom firme, pedido aos dois que moderassem suas declarações e mandou retirar dos anais as palavras ofensivas por eles dirigidas um ao outro.
São Luís, 21 de Fevereiro de 2024.