A tragédia ocorrida no final da tarde de quarta-feira (3), sobre a Ponte José Sarney – quando diante de uma tentativa de assalto, um passageiro resolveu agir como justiceiro, sacou uma arma e matou a tiros, conscientemente, o assaltante Carlos Araújo, de 16 anos, e, provavelmente por falta de controle, tirou a vida da estudante Alexandrina Rodrigues, de 19 anos – colocou mais pólvora no já explosivo debate sobre segurança pública no Maranhão, em especial em São Luís. Nesse cenário, a população acompanha amedrontada e indignada uma guerra de números e de acusações entre o governo estadual e seus adversários. O primeiro tenta convencer o cidadão de que em apenas cinco meses melhorou o combalido Sistema Estadual de Segurança Pública e, assim, reduziu a criminalidade. O outro lado também se vale de números e tenta mostrar que, apesar de tudo, o governo passado fez mais.
Qualquer avaliação isenta e equilibrada certamente concluirá que nenhum dos dois está 100% certo, já que ambos recorrem a argumentos convincentes e a outros nem tanto. A guerra é, no fundo, política, com as vozes do que restou do grupo Sarney – a começar pelo próprio ex-presidente José Sarney na sua coluna domingueira no jornal O Estado do Maranhão – procurando e dando forma a todo e qualquer indício que possa evidenciar defeitos na política de segurança pública do novo governo. Por sua vez, as vozes governistas – a começar pelo governador Flávio Dino, que trata do assunto no twitter – propagam uma serie de medidas que estariam melhorando o desempenho do aparelho policial e, com isso, derrubando os números da violência no estado.
As manifestações feitas pelas vozes do que restou do grupo Sarney fazem todo sentido quando reclamam da barbárie que continua infernizando a Ilha de Upaon Açu, em especial a cidade de São Luís, onde vivem quase 1,3 milhão de maranhense e hoje é pontilhada por bolsões de pobreza como Cidade Olímpica, Coroadinho, áreas do eixo Itaqui/Bacanga, Ilhinha, Jaracaty, entre muitas outras onde o crime dá as cartas. Na mesma medida, as vozes governistas contra-atacam lembrando que tudo o que está aí em matéria de violência é a soma de governos do Grupo Sarney, principalmente os últimos cinco anos da governadora Roseana Sarney (PMDB) e acrescentam que, não fossem as medidas já tomadas pelo governador Flávio Dino (PCdoB), a situação estaria muito pior.
Nesse embate, o governador Flávio Dino leva uma pequena vantagem, à medida que o seu argumento mais forte, eficiente e incontestável é o de que seu governo está consertando problemas gerados em governos passados, a começar pelo anterior. Nos debates recentes na Assembleia Legislativa sobre segurança, a oposição sempre perdeu força quando governistas responsabilizaram a ex-governadora Roseana Sarney pelo que está acontecendo no estado. Mas no contrapeso a tropa governista não consegue esconder seu mal-estar quando tragédias como a que aconteceu quarta-feira na Ponte José Sarney, que desenham, com precisão, o tamanho do problema da violência no Maranhão.
Em meio a ditos e desmentidos envolvendo governo e oposição, algumas verdades se impõem, gostem ou não os dois segmentos. O aparelho policial é pobre e o efetivo é pequeno, o que torna impossível garantir segurança, pelo menos razoável, num território de 331 mil quilômetros quadrados, dividido em 217 municípios, com uma população de 7 milhões de habitantes – um sétimo concentrado em São Luís (1,1 milhão), 19% de analfabetos, 148 policiais por 100 mil habitantes, prisões explodindo, e parte da população pobre.
O governador Flávio Dino prometeu dobrar o efetivo policial, hoje com nove mil integrantes, entre policiais militares e civis, mas tudo o que conseguiu até agora foi convocar mil aprovados em concurso realizado ainda no governo Roseana Sarney, dos quais cerca de 350 estão sendo treinados para serem colocados nas ruas. Não se duvida do propósito do governador, mas duvida-se de que ele venha dispor de condições financeiras para bancar o projeto. Além disso, somente aumentar o efetivo não resolve o problema cuja raiz está na desigualdade econômica, social e cultural da população, realidade que todo comunista que se preza conhece, ainda que tenha nascido, crescido e se formado num ambiente de elite.
Problemas de hoje foram herdados
Há pelo menos três décadas a segurança pública vem sendo um problema grave no Maranhão. Os governos desse período enfrentaram enormes desafios. No governo João Castelo, São Luís, que tinha a metade da população atual, começou a mudar com a chegada do Consórcio Alumar e a realidade daquele momento de transformação foi mantida sob certo controle por uma política de segurança relativamente bem sucedida sob o comando do secretário Raimundo Marques. Já no governo Luís Rocha o momento mais crítico foi em meados do terceiro ano, quando a Polícia Civil cruzou os braços numa greve surpreendente num período de ditadura. Rocha reagiu indignado e ao invés de negociar, mandou prender os principais líderes do movimento, entre eles o médico legista João Bentivi. A pistolagem mostrou os dentes em vários casos, entre eles o assassinato do empresário Chico Baixinho, homem forte no governo, até hoje não esclarecido inteiramente.
Sob a euforia da presidência de José Sarney, o Maranhão viveu relativa tranquilidade no Governo Epitácio Cafeteira. Era porém uma calma aparente, porque o crime organizado e a pistolagem ganharam corpo e força, principalmente na Região Tocantina, onde imperava Davi Alves Silva. De efeito retardado, a bomba caiu na mesa do governador João Alberto que, diante das pressões, realizou a Operação Tigre, uma ação de enfrentamento direto, sob o comando do secretário Pedro Elmano e do coronel Walter Brasil, sem medir consequência e cujo resultado foi um Maranhão mais aliviado em questão de meses.
O governo Edison Lobão teve três secretários: o hoje desembargador Rachid Maluf, o coronel do Exército Raimundo Ventura e o advogado tocantino Agostinho Noleto. Lobão enfrentou problemas, mas no seu governo não ocorreu nenhum evento marcante nessa área. Os oito primeiros anos de governo de Roseana Sarney foram agitados. Primeiro com a declaração de guerra ao crime organizado, que agitou o Maranhão e, na esteira disso, a CPI do Crime Organizado da Câmara Federal, que contribuiu muito para desmontar as quadrilhas da época. Mais tarde, aconteceu a execução do delegado Mendonça, que chocou o Maranhão, e a reação que resultou, entre outras coisas, na chacina do Bando Bel, numa estrada do interior. Naquele período, Roseana teve três secretários de Segurança, sendo o último o delegado federal e hoje deputado estadual Raimundo Cutrim, que efetivamente começou a mudar a máquina policial.
Durante os seus cinco anos de governo, José Reinaldo Tavares enfrentou os mais diversos problemas, mas manteve uma política de segurança equilibrada, parte dela comandada também por Raimundo Cutrim. No Governo Jackson Lago a política de segurança foi agitada pelo diferencial de ter uma mulher, Eunice Vidigal, no comando, já com São Luís enfrentando problemas de assaltos nas ruas. Nos quase seis anos do segundo período de Roseana Sarney a segurança foi comandada pelo agente federal Aluísio Mendes, hoje deputado federal, que enfrentou as consequências de São Luís ter-se transformado numa metrópole, com o consequente aumento da marginalidade e da chegada de um inimigo muito mais poderoso, o crack. Daí os frequentes assaltos em ônibus, em frente a bancos, em plena luz do dia. Foi também quando o crime organizado começou a dar as cartas dentro dos presídios, resultando em chacinas, degolas, incêndio a ônibus, como o de janeiro de 2014, que terminou em tragédia, cujas as imagens de crianças incendiadas foi notícia em todo o planeta.
O que o governo Flávio Dino está enfrentando é reflexo direto dos acertos e erros de todo esse período. Apesar dos problemas, o atual governo tem crédito de sobra para acertos ou também deixar sua cota de embaraços para os próximos.
PONTOS & CONTRAPONTOS
Votaria contra
Mesmo depois de a maioria da Assembleia Legislativa ter mandado para o arquivo morto o requerimento de sua autoria sugerindo que o governador Flávio Dino pedisse tropas federais para combater o crime nas ruas de São Luís, o deputado Adriano Sarney (PV) (foto) insiste no propósito. Argumenta que a Casa aprovou, na legislatura passada, requerimento idêntico de autoria do deputado Bira do Pindaré (PSB) dirigido à então governadora Roseana Sarney. Só que o contexto era outro, a Assembleia Legislativa tinha outra composição e o deputado não estava lá – se estivesse, muito provavelmente teria votado contra, como votou contra o seu requerimento o deputado Hemetério Weba, do seu partido, o PV.
José Carlos Castelo Branco
A coluna registra com muito pesar a morte do publicitário José Carlos Castelo Branco (foto). Membro destacado de uma competente geração de profissionais da publicidade formada pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) na segunda metade dos anos 70, José Carlos construiu com Alex Brasil uma sociedade que modernizou a publicidade em São Luís, juntamente com Evilson Almeida e outros. Mais tarde, surpreendeu ao abrir o restaurante Cheiro Verde, que até hoje é uma referência. Deixa muitos amigos e vai fazer falta, principalmente porque partiu muito cedo.
São Luís, 05 de junho de 2015.
Muito boa a matéria sobre Segurança.
Apenas lembrando: o nome dos dois primeiros Secretários de Roseana foram Cel. Seixas e, se não me falha a memória, Cel. Xexéu (não sei se era apelido ou nome)