O rompimento de duas barragens de lama produzida pela mineração de ferro na região montanhosa de Minas Gerais, que arrasou o povoado de Mendes Rodrigues, no histórico município de Mariana, deixou muitos prejuízos materiais, duas pessoas mortas e 22 desaparecidas até ontem e, nesse rastro destruidor, uma imensurável tragédia ambiental, chocou o Brasil. Fez lembrar outras tragédias ambientais, como a da pequena cidade húngara de Ajka, a 160 km de Budapeste, que em setembro de 2010 amanheceu inundada pela “lama vermelha”, um dejeto mineral espesso e altamente cáustico, vazada de um tanque de estocagem pertencente a um complexo de produção de alumínio. As barragens rompidas de Minas e o tanque vazado da Hungria, sem dúvida estruturas produzidas por avançadas técnicas de construção civil, revelaram que, por maiores que sejam os cuidados, há sempre risco. E a força dos seus impactos empurram as atenções para regiões onde há intensa atividade mineradora, como a Ilha de São Luís, onde o complexo de produção de alumínio da Alumar armazena em gigantescos tanques bilhões de toneladas de “lama vermelha”, igual à que inundou a cidade húngara de Ajka.
O caso dos tanques de “lama vermelha” de São Luís é especial, por ser fruto de um dos maiores complexos de produção de alumínio do mundo. O Consórcio Alumar, encrostado num pedaço das reentrâncias maranhenses, um dos mais importantes berçários de vida oceânica do continente, é conhecido internacionalmente pela força da competente propaganda por meio da qual sua principal dona, a Alcoa, o dissemina como o mais moderno, ambientalmente avançado e correto do ramo. Inaugurada há quase 30 anos, a colossal estrutura industrial da Alumar, que já recebeu investimentos de mais de US$ 3,5 bilhões, alcançou a invejável meta de faturar mais de U$ 800 milhões por ano, gerar muitos empregos diretos e indiretos, movimentar a economia estadual e pagar impostos expressivos – depois de quase 30 anos de isenção. O alumínio e a alumina que saem dos seus fornos na Ilha de São Luís ganham o mundo como produtos essenciais a uma ampla variedade de segmentos vitais para a civilização – vai da indústria da aviação à indústria química, passando por mais de uma dezena de itens.
Ao mesmo tempo, divulga com muita intensidade a sua festejada política ambiental, exibindo sem limite a sua condição de empresa modelo. Mas é exatamente nessa área crucial que está o que muitos identificam como o “calcanhar de Aquiles” do Consórcio Alumiar, como acontece com toda indústria que produz alumínio. E o motivo é ao mesmo tempo muito simples e muito grave: para produzir uma tonelada de alumínio, são usadas quatro toneladas de bauxita, um minério altamente tóxico. E desse processo sobram duas toneladas do dejeto conhecido como “lama vermelha”, um líquido espesso, cáustico, altamente corrosivo, e – afirmam alguns – tóxico. Esse bastardo mineral é armazenado em gigantescos tanques, exatamente porque não pode ser pura e simplesmente dispensado, descartado ao leu, principalmente porque até agora não se sabe o que fazer com ele.
Os tanques da Alumar armazenam “lama vermelha” de quase três décadas de produção intensa, que já gerou um passivo ambiental cujo futuro é, para muitos, uma incômoda e perigosa incógnita. O poderoso cartel do alumínio já gastou alguns milhões de dólares em experimentos destinados a encontrar uma utilidade para a “lama vermelha”, principalmente na construção civil, apostando matar dois coelhos com uma só cajadada: transformar o dejeto num grande filão comercial e, de quebra, resolver uma seríssima questão ambiental. Mas devido a sua natureza cáustica e corrosiva, a “lama vermelha”, porém, tem resistido a encontrar um novo destino.
Mesmo reconhecendo o extremo cuidado e o uso da tecnologia para evitar que o renitente dejeto cáustico e corrosivo fuja do confinamento que lhe é imposto e se espraia, ambientalistas do mundo inteiro, juntamente com órgãos de fiscalização e controle, a começar pelo Ministério Publico, mantêm – ou pelo menos dizem que mantêm – vigilância cerrada sobre a segurança dos tanques de “lama vermelha” produzida pela Alumar. É verdade que até hoje não se teve notícia de um vazamento perigoso nos tanques da Alumar. Nem houve qualquer registro recente, por exemplo, de que o Ministério Público do Maranhão mantenha um monitoramento que inclua inspeções periódicas nos tanques onde o dejeto rejeitado permanece confinado. Talvez porque esteja em vigor uma política de controle tão sofisticada que dispense informações à sociedade. Mas também não será surpresa se os relatórios verbais e eventuais feitos por dirigentes técnicos da Alumar sejam suficientes para convencer o MPE e a Secretaria de Estado do Meio Ambiente de que tudo esteja bem.
Se vivo estivesse, o professor e poeta Nascimento Moraes Filho, fundador do Comitê de Defesa da Ilha – do qual há muito não se houve falar – e adversário ferrenho do projeto Alumar, continuaria protestando. Seus brados cheios de indignação, ainda que eventualmente infundados (?), faziam todo sentido como alerta. Colapsos como os que transformaram em tragédias o rompimento das barragens de Minas Gerais e o vazamento do tanque de “lama vermelha” na Hungria lhe dão toda razão.
PONTOS & CONTRAPONTOS
Sarney leva lição ao PMDB
“O povo nos colocou na oposição”. Com essa frase, ex-presidente José Sarney inverteu ontem o sentido da fragorosa derrota que o partido dele sofreu nas eleições de 2014 no Maranhão. Foi o que demonstrou, mais uma vez, a velha e respeitada raposa, ao visitar ontem o PMDB, comandado pelo senador João Alberto, o seu mais fiel aliado, depois de uma convenção cujos preparativos foram marcados por fortes sinais de fissuras. Com a sua visão aguda e a sua experiência de mais de meio século de militância ininterrupta, Sarney mostrou que consegue enxergar vantagem até nos tropeços e nos naufrágios partidários. E a lógica da sua frase é simples e indiscutível. As vitórias do PMDB significavam que o povo o queriam no poder. A derrota foi apenas uma mudança na visão do povo, que agora o quer na oposição. Só pensa assim quem tem visão política apurada, porque a regra é que as derrotas eleitorais são vistas como rejeição aos partidos derrotados. Com a leitura, Sarney deu aos pemedebistas uma lição política com a precisão e a eficiência que a ex-governadora Roseana Sarney e outros chefes do partido não conseguiram expressar em seus discursos no dia da convenção. É possível que depois da visita de Sarney à sua sede – também uma demonstração de prestígio do senador João Alberto – o PMDB saia da timidez e vá à luta.
Eliziane ganha mais independência
A deputada federal Eliziane Gama deu ontem um passo decisivo para consolidar seu ambicioso projeto político, que tem como próximo objetivo chegar à Prefeitura de São Luís no ano que vem. Com o aval total de Marina Silva e da executiva central, ela comandou a primeira convenção da Rede Sustentabilidade no Maranhão, saindo do evento presidente regional da nova agremiação. E nessa condição, a parlamentar consolidou sua condição de candidata à cadeira principal do Palácio Manoel Bequimão, confirmando que será o mais forte adversário ao projeto de reeleição do prefeito Edivaldo Jr. (PDT). Depois de atravessar um período de indefinição partidária em meados do primeiro semestre, quando colocou o primeiro pé fora do PPS – que, vale registrar, lhe deu amplo espaço na Câmara Federal -, a líder nas pesquisas que medem a corrida à Prefeitura de São Luís ganhou ontem as condições de se firmar também como líder partidária, ampliando ainda mais a sua independência política.
São Luís, 07 de Novembro de 2015.