Quando José Sarney assumiu a presidência da República, no dia 15 de Março de 1985, o Brasil estava mergulhado em tensão, expectativa e incerteza, mas respirando esperança. Tensão porque naquela data morria, em definitivo, a ditadura militar; expectativa e incerteza por causa da saúde do presidente Tancredo Neves, que morreria pouco mais de um mês depois; e esperança, porque, depois de duas décadas de ditadura militar, com supressão de liberdades, censura, repressão brutal e assassinatos cometidos por agentes do Estado contra adversários do regime, acreditava-se que o Brasil mergulharia numa nova era, moderna e, principalmente, democrática. Contra todos os prognósticos e expectativas, José Sarney fez a sua parte: restaurou a plenitude democrática, liquidou a censura, baniu a repressão, tirou a esquerda da clandestinidade e garantiu direitos plenos a todos e convocou a Assembleia Nacional Constituinte, que em 1988 entregou à Nação uma nova ordem institucional, uma democracia plena, com direitos e deveres bem definidos e, mais do que isso, um sentimento muito forte: ditadura nunca mais. E coroou a transição passando a faixa ao primeiro presidente eleito na nova era, o jovem político alagoano Fernando Collor de Mello.
Hoje, passadas três décadas do momento em que José Sarney consolidou a restauração democrática, entregando um novo País ao seu sucessor, iniciando o processo natural da alternância pelo voto direto, o Brasil é novamente assediado pelo fantasma do autoritarismo, agora acompanhado de primarismo político, desprezo pelas instituições, obscurantismo cultural, mediocridade e nítida inclinação para o autoritarismo. Tudo isso concentrado na figura do presidente Jair Bolsonaro (PSL) que, usando todos os recursos, a começar pela falta de ética e pela manipulação grosseira da realidade, chegou legitimamente à Presidência da República.
Antes do acidente Jair Bolsonaro, fora mais de 12 mil dias passados desde que José Sarney iniciou a transição da ditadura para a democracia, enfrentando, de um lado, pressões de militares e, de outro, da sociedade que se mobilizava pelas organizações partidárias e civis. O Brasil viveu, então, um processo fantástico de ajustes com a passagem de sete presidentes: o próprio José Sarney (PMDB), Fernando Collor de Melo (PRN), Itamar Franco (PMDB), Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (PMDB).
À frente de um Governo inicialmente reformador, mas marcado pela corrupção, o presidente Fernando Collor de Mello (1991-1992) usou todos os artifícios políticos e jurídicos possíveis, mas acabou renunciando no dia 29 de dezembro de 1992 para se livrar do peso das leis. A manobra não deu certo: e, no dia seguinte, o Congresso Nacional lhe cassou os direitos políticos e o tornou inelegível. Durante o seu Governo, porém, não há registro de que Fernando Collor tenha pronunciado uma só frase questionando as instituições ou exibindo qualquer traço de autoritarismo. Seu sucessor, Itamar Franco (1992-1994), político mineiro sério e temperamental, com um histórico de decência, devolveu a confiança dos brasileiros com o Plano Real, fechando o primeiro mandato da nova era sem ter manifestado qualquer simpatia pelo autoritarismo ou atacado as instituições democráticas.
Veio a era tucana, com dois mandatos do socialdemocrata, presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que governou de 1995 a 2002, consolidando a democracia com um Governo liberal no plano econômico e com forte inclinação social. FHC restaurou a reeleição e se reelegeu. Durante os dois mandatos, ficou conhecido no planeta como um democrata pleno, que defendeu as instituições, no discurso e na prática, à frente da segunda maior democracia ocidental. Durante seus mandatos, nenhuma palavra contra as instituições e as liberdades civis.
Lula da Silva virou a página e iniciou o período da esquerda, chegando endeusado pelas camadas mais pobres, festejado pela maior parte da classe média e visto com restrições pela banda menor, e encarado com fortes restrições pelas elites. Governou democraticamente por oito anos (2003-2010), sem que nesse período tivesse levantado qualquer bandeira contra as instituições democráticas. Sua sucessora, Dilma Rousseff, quebrou paradigma ao entrar para a História como a primeira mulher a governar o País. Manteve o viés social do Governo, se reelegeu e sofreu um polêmico e questionado impeachment no dia 31 de Agosto de 2016, durante o grande debate institucional travado no País, mas em nenhum momento se pronunciou tentando desacreditar as instituições nem ensaiou algum arroubo autoritário.
O vice Michel Temer (PMDB) comandou o País de 2016 a 2018 em meio a uma forte crise política e institucional. Dono de uma posição de centro, Michel Temer exibiu sua postura de constitucionalista, defendendo as regras da Constituição de maneira intransigente.
Depois de comandado por esses democratas da direita civilizada, do centro e da esquerda, o Brasil elegeu o presidente Jair Bolsonaro, um político de extrema-direita, conservador e primitivo, que não tem formação elementar, que não consegue separar o público do privado, não compreende o que é ética, prudência, bom senso, que defende o uso de arma de fogo por cidadão comum, que faz pouco do esforço gigantesco que ONGs fazem para preservar o meio ambiente, que acha que massacres como o desta semana numa prisão de Altamira são bons para a sociedade, que lamentou não ter alguém com um revólver para abater o morador de rua do Rio de janeiro, que surtado matou duas pessoas à faca, que defende a tortura praticada por agentes da repressão durante a ditadura, que tem um torturador e assassino frio e cruel como ídolo, que declara, com ar de deboche, saber como um jovem oponente da ditadura foi assassinado, mexendo, com requinte de sadismo, numa ferida familiar, e que não esconde uma vontade doentia de amordaçar a imprensa livre do Brasil.
Os brasileiros, que deveriam estar tranquilos e avançando, se veem de novo mergulhados na perplexidade e na incerteza. Mas com uma convicção: juntas, as instituições e a sociedade são mais fortes.
PONTO & CONTRAPONTO
Para ser candidato do MDB, Astro de Ogum terá que encarar alguns desafios dentro e fora do partido
O vereador Astro de Ogum está mesmo decidido a deixar o PL e se filiar ao MDB, alimentando a possibilidade de vir a ser o candidato do Grupo Sarney à Prefeitura de São Luís. O ex-presidente da Câmara Municipal, porém, avalia uma série de pequenos entraves, que precisará superar se de fato decidir migras para as fileiras emedebistas. O primeiro deles é a pré-candidatura do ex-deputado Victor Mendes, bancada dentro do partido pelo deputado estadual Roberto Costa, dono de grande peso hoje dentro do partido. Depois, terá que conseguir o aval da ex-governadora Roseana Sarney, que hoje já não nutre por Astro de Ogum a mesma simpatia de quando ele era mais babalorixá do que político. Além disso, o deputado Adriano Sarney ensaia ser candidato a prefeito pelo PV, e se esse projeto ganhar corpo, a família Sarney certamente se mobilizará em torno dele – disse ninguém duvida. Além disso, como reagirá o PL diante dessa mudança? Não é, portanto, só chegar, entrar e ganhar a vaga de candidato de presente.
Daniella Tema estaria inclinada a disputar a Prefeitura de Presidente Dutra
A deputada Daniella Tema (DEM) não confirmou nem desmentiu a especulação segundo a qual ela estaria avaliando seriamente a possibilidade de disputar a Prefeitura de Presidente Dutra, sua terra natal. Casada com o médico Cleomar Tema (PSB), prefeito de Tuntum e com forte liderança em toda a região, Daniella Tema detém cacife político para entrar numa disputa desse quilate. Além da força política e do potencial eleitoral, a parlamentar conta ainda com um fator de peso: nutricionista por formação, durante quase três anos ela dirigiu com competência e eficiência o importante e estratégico Hospital Regional de Presidente Dutra, que dá suporte emergencial a mais de uma dezena de municípios da região. Seu trabalho ali foi elogiado pelo secretário de Saúde Carlos Lula e até pelo governador Flávio Dino. Há quem diga que Daniella Tema prefere continuar cumprindo seus compromissos com seus eleitores como membro a Assembleia Legislativa, o que está fazendo com desenvoltura surpreendente. Mas há quem garanta que ela está inclinada a encarar o desafio da guerra eleitoral em Presidente Dutra. Se fizer a opção pela disputa municipal, os outros candidatos que se preparem, porque ela é um adversário difícil de ser batido.
São Luís, 31 de Julho de 2019.