Oposição e Governo voltam a se digladiar, por meio de porta-vozes os mais diversos, a respeito de frete de aviões para o deslocamento do governador Flávio Dino (PCdoB) e secretários, tendo como foco principal os voos de jatinho transportando o chefe do Poder Executivo para diferentes partes do País, na esmagadora maioria das vezes para Brasília. Um bate-boca descabido, fora de contexto, trazendo a público números até modestos, se comparados aos que foram encontrados em outros estados. A Oposição revela, em tom de denúncia, que de janeiro até aqui o Governo do PCdoB gastou R$ 6,8 milhões com aluguel de aviões, vendo nisso um escândalo. Provocado, o Governo reage mostrando que, nos seus dois anos de existência (2015/16), gastou R$ 9,4 milhões com esse serviço, o que gerou uma média de R$ 391,6 mil ao mês, enquanto que somente em 2014, seu último ano, o Governo Roseana Sarney (PMDB) gastou R$ 15 milhões com o mesmíssimo serviço, o equivalente a R$ 1,2 milhão/mês.
A primeira pergunta que deve ser feita para dar sentido a esse embate é a seguinte: qual dos dois governadores está certo? A resposta sensata é: nenhum está errado, salvo se alguma dessas contas estiver contaminada pelo vírus purulento do superfaturamento, da fatura paga sem serviço efetivamente prestado e de outros malefícios resultantes da contaminação, como, por exemplo, uso de aviões pagos pelo Estado para fins particulares, que não guardem qualquer relação com a atividade pública. Sem inchaço de corrupção na fatura, o aluguel de aviões é um recurso essencial para o governo de um estado como o Maranhão, com 331 mil quilômetros quadrados – formado por regiões que vão do litoral à selva pré-amazônica, passando, sertão, alagados, cerrado, chapadões e selva amazônica – e cuja Capital dista três mil quilômetros do centro das decisões do País. E sem dispor ainda de uma infraestrutura rodoviária adequada, que faça um veículo terrestre vencer em pouco tempo distâncias que alcançam mil quilômetros.
Até 1994, o Governo do Estado dispunha de uma frota aérea de quatro aeronaves – um turboélice “King Air” de oito lugares, dois bimotores Sêneca de quatro lugares cada e dois monomotores Piper. Levando em conta pilotos – que eram servidores com salários diferenciados -, mecânicos – também mão de obra especializada e cara -, revisões periódicas feitas por empresas especializadas fora do estado, combustíveis, licenças, alvarás e muitos outros custos tornavam a frota um item de custo excessivamente elevado para o Estado, mas do qual nenhum governo podia abrir mão. Nas suas viagens para fora do estado, principalmente para Brasília, governador, secretários e assessores se deslocavam em aviões de carreira, que faziam rotas consolidadas e em horários adequados. O custo total desse serviço era tão elevado que, ao assumir o Governo em janeiros de 1995, uma das primeiras medidas de Roseana Sarney foi exatamente vender a frota de aviões do Estado e, a partir de então, contratar os serviços de empresas aéreas para atender às necessidades do Governo. Na época, falou-se de uma economia superior a 50%, e de lá para cá ninguém se interessou em reverter a situação.
Com exceção dos grandes estados – a começar por São Paulo, que tem uma frota que inclui dois jatinhos -, todos os estados menores entraram nessa linha, com os governadores aos poucos substituindo aviões de carreira por jatinho, tendo Roseana Sarney sido uma das pioneiras no uso desse recurso. A mudança foi se justificando com a dinâmica que tomou conta da vida do país com seus oito milhões de quilômetros quadrados, exigindo de governantes estaduais meios de deslocamentos muito mais eficientes, o que se encaixou com o uso do jatinho. Um serviço caro, é verdade, mas se levadas em conta as vantagens, os contrato firmados no Governo anterior e mantidos em novas bases no Governo de agora se justificam plenamente. Permite, por exemplo, que o governador participe de uma audiência em Brasília no final da manhã e esteja em São Luís antes das 15 horas para compromissos agendados no expediente da tarde. Do contrário, teria de aguardar 10 horas, para chegar em São Luís no início da madrugada.
Portanto, discutir isso hoje já parece fora de tempo, antiquado mesmo. E justificar ataques ao Governo evocando uma frase precipitada de um governante empolgado em início de mandato só leva à conclusão de que se trata de mera provocação política. Faz parte do jogo, mas poderia ser feita com temas bem mais interessantes.
PONTO & CONTRAPONTO
Caprichos do sonho americano
Até Donald Trump, o bilionário sem medidas que assumirá em breve a presidência dos Estados Unidos, considerou “absurda” a decisão do presidente que sai, Barack Obama, de deixar autorizada a compra de um novo Air Force One, o ultrassofisticado avião presidencial norte-americano. Num gesto que soou arrogante e precipitado, visto por muitos apenas como uma oportunidade de estocar Obama, Trump mandou “cancelar” a compra. Presidente eleito, o republicano deveria respeitar a tradição e se deslocar agora num dos oito Boeing 727-200 da frota do governo, ultra-equipados, usados para as viagens do vice-presidente e dos secretários (ministros) norte-americano. Trump atropelou a regra, esnobou a tradição e continua se deslocando à bordo da sua própria aeronave: também um Boeing 727-200, tecnicamente igual ao que foi colocado à sua disposição, com a diferença de que o “Trump Force One”, como foi apelidado durante a campanha eleitoral, é uma maravilha transformada em um sofisticado apartamento de luxo, com salas para jantar, reuniões e lazer, com uma suíte cujas torneiras do banheiro são de ouro 24 quilates, e que custou a bagatela de US$ 100 milhões, o equivalente a R$ 327 milhões.
Contas da realidade maranhense
Deixando o sonho americano e voltando à polêmica aérea que se dá no Maranhão, a Coluna fez as contas e concluiu que para gastar o valor do avião do presidente eleito Donald Trump, com base nos R$ 6 milhões que pagou neste ano, o governador Flávio Dino e seu governo precisariam voar a mesma quantidade de horas durante 54 anos. Já a ex-governadora Roseana Sarney, levando em conta o custo da movimentação aérea do seu governo em 2014, R$ 15 milhões, precisaria de 21 um anos.
São Luís, 27 de Dezembro de 2016.