A presidente da Assembleia Legislativa, deputada Iracema Vale (PSB), foi reeleita ontem para comandar a Casa no biênio 2025/2026. Sua eleição, porém, em votação secreta, se deu no mais surpreendente evento político ocorrido no Poder Legislativo nos últimos tempos. Numa movimentação imprevista, só evidenciada na primeira contagem dos votos, o candidato de oposição, deputado Othelino Neto (Solidariedade), obteve 21 dos 42 votos, resultando num empate que se confirmou em dois escrutínios, de modo que a presidente foi eleita por ter mais idade (56 anos) do que o oponente (40 anos), conforme critério regimental. A eleição repercutiu fortemente no meio político.
A surpresa continuou na disputa 1ª vice-presidência, entre os deputados Antônio Pereira (PSB) e Júlio Mendonça (PCdoB), vencida pelo primeiro pelo placar de 24 votos a 18. Uma terceira disputa, que se daria pela 1ª Secretaria da Mesa, só não ocorreu porque na última hora o candidato de oposição, deputado Fernando Braide (PSD), desistiu e garantiu a eleição do deputado Davi Brandão (PSB), candidato da chapa situacionista. Os demais membros da Mesa Diretora foram eleitos com larga maioria de votos dados à chapa “União e Continuidade”, encabeçada por Iracema Vale.
A eleição para presidente e 1º vice-presidente da Assembleia Legislativa se deu num contexto em que as previsões e a lógica foram atropeladas pelo movimento inesperado. Até o início da contagem dos votos, o ambiente no plenário indicava que a presidente Iracema Vale, que fora aclamada em fevereiro de 2023, seria reeleita com pelo menos 35 dos 42 votos, garantidos pela base parlamentar governista, e que a candidatura do deputado Othelino Neto, que na mais otimistas das previsões alcançaria entre sete e dez votos, seria um movimento para demarcar o território da oposição na Casa. O resultado que saiu da urna derrubou todas as previsões, feitas inclusive por alguns deputados da base governistas momentos antes da votação.
Os números da eleição para presidente da Assembleia Legislativa tiveram repercussão imediata no meio político e chegou ao Palácio dos Leões, onde o governador Carlos Brandão (PSB) recebia ministros de Estado que vieram ao Maranhão anunciar investimentos de pelo menos R$ 40 bilhões em obras do Novo PAC, principalmente em infraestrutura. O comando político do Governo foi apanhado de surpresa, uma vez que não havia qualquer sintoma de que metade da sua base parlamentar se posicionaria contra a orientação no sentido de consagrar os candidatos da chapa “União e Continuidade”. Entre o primeiro e o segundo escrutínio houve um intervalo, no qual aconteceu uma frenética onda de telefonemas, mas o resultado foi o mesmo no segundo escrutínio, sem que nenhum voto fosse mudado, numa clara evidência de que o projeto não era eleger o deputado Othelino Neto, mas reeleger a presidente Iracema Vale no bojo de um recado político estridente.
Nenhum deputado deixou escapar o que estava sendo arquitetado, de modo que nem a presidente Iracema Vale nem os articuladores governistas detectaram sinais de um movimento tão forte dentro da sua própria base, que envolveu nada menos que 16 deputados tidos como fiéis. A especulação mais frequente foi a de que parte da bancada governista estaria insatisfeita, de um lado por uma suposta inflexibilidade do comando da Casa em relação a interesses dos deputados, e em parte por não estarem esses parlamentares – chamados por uns de “rebeldes” e por outros de “traidores” – insatisfeitos com os articuladores governistas. Numa terceira linha de interpretação, rumores deram conta de que o movimento incluiria também insatisfações relacionadas com o resultado das eleições municipais. E, finalmente, a teoria mais abrangente: uma medição de força entre o brandonismo e o dinismo. Mas nada de concreto veio à tona.
O fato é que a eleição da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa, em especial a eleição da presidente Iracema Vale, revelou que a base de sustentação do Governo não é tão sólida quanto o próprio Governo imaginava. E que existe alguma peça muito importante solta na articulação governista. Isso porque ficou muito claro que a intenção dos articuladores do movimento não foi eleger o deputado Othelino Neto, mas marcar uma posição com cores bem nítidas, com sinais de recado.
PONTO & CONTRAPONTO
Iracema assimila resultado, agradece os 21 votos, diz que o jogo zerou e diz que trabalhará para os 42
A presidente Iracema Vale não se deixou abalar pelas circunstâncias políticas em que se deu a sua reeleição. Ela sofreu o impacto inicial do resultado da votação, mas com a experiência política de várias eleições, ela assimilou o golpe. Isso ficou evidenciado na entrevista que ela concedeu após, durante a qual enfrentou com segurança perguntas questionando o ocorrido.
Iracema Vale não titubeou. Interpretou o resultado da eleição como uma manifestação de independência do Poder Legislativo. No que diz respeito à sua posição pessoal, ela não entrou em detalhes, mas deixou claro que havia assimilado o resultado e que tem consciência de que fez a sua parte no comando administrativo e político da Casa. E garantiu que a eleição “zerou o jogo” e que será presidente dos 42 deputados, sem entrar na onda
Ela definiu o resultado: “Esta é a vitória de uma pessoa que não tem parentes políticos na conjuntura do estado. É a vitória de quem venceu com o suor do próprio rosto e com o esforço das lideranças que acreditam e confiam no nosso trabalho. É uma vitória dos amigos leais que temos na Assembleia Legislativa do Maranhão”.
E acrescentou: “Coloquei meu trabalho para ser avaliado pelos deputados, não fiz barganha, nem propostas indecorosas, até porque na Casa temos homens e mulheres valorosos, e eu respeito a dignidade e as escolhas do povo do Maranhão, que colocou aqui pessoas de bem e de caráter.
Sobre o desfecho da eleição: “Nosso adversário se articulou bem e tem gente muito forte no Brasil ao seu lado, gente forte atuando. Mesmo assim vencemos. Nunca me senti tão feliz em ser mais velha”,
E agradeceu o apoio do governador Carlos Brandão, segundo ela o maior líder político do Maranhão nos últimos tempos: “E sob a liderança dele estão os 21 deputados que votaram em mim. Eu quero agradecer ao governador pela confiança depositada em nosso trabalho”.
A presidente Iracema Vale vai comandar a nova Mesa Diretora, formada pelos seguintes deputados: 1º vice-presidente: Antônio Pereira (PSB), 2º vice-presidente: Fabiana Vilar (PL), 3º vice-presidente: Hemetério Weba (PP) e 4ª secretaria: Andreia Rezende PSB) e 1º secretário: Davi Brandão (PSB), 2º secretário: Glaubert Cutrim (PDT), Osmar Filho (PDT) e Guilherme Paz (PRD).
Aval de deputados da base governista reforça espaço de Othelino Neto como voz de oposição
O deputado Othelino Neto saiu da eleição maior do que entrou e do que ele próprio esperava. Com o apoio de pelo menos 17 deputados da base governista, o ex-presidente teve reforçada a sua posição contrária aso Governo. Ele se comportou com absoluta calma durante a votação, parecendo que o resultado foi maior do que a previsão feita pelos seus próprios aliados.
E chamou a atenção o fato de ele não ter sido festejado pelos que lhe deram o voto, reforçando a impressão de que o propósito dos governistas rebelados não era a sua eleição, mas sim uma tomada de posição cuja causa ainda não está tão clara.
Depois da primeira eleição, quando ficou claro o empate, a senadora Ana Paula Lobato (PDT) foi para o plenário da Assembleia Legislativa, onde permaneceu ao lado do marido até o desfecho da eleição presidencial.
Em entrevista após o desfecho do pleito, o parlamentar oposicionista declarou: “A Assembleia deu um recado claro ao Governo”.
São Luís, 14 de Novembro de 2024.