O Maranhão é, desde segunda-feira, palco de mais uma edição de um movimento de desrespeito às leis vigentes no país. Num atropelo ao que reza a Constituição Federal, confirmado integralmente pela Constituição do Estado, policiais civis resolveram cruzar os braços para uma greve. A paralisação não se dá por motivos graves – do tipo atraso de salário, redução de vencimentos, suspensão de vantagens, exploração por sobrecarga de trabalho ou coisa parecida. O movimento é motivado porque o governador Flávio Dino (PCdoB) ainda não bateu martelo para definir uma nova tabela salarial para a categoria e mais os chavões que sempre constam no elenco de motivos, como melhores condições de trabalho uma série de filigranas – todas relacionadas diretamente com o holerite. Por isso, os servidores da Polícia Civil se julgaram ainda no direito de desacatar duas decisões do Tribunal de Justiça, uma declarando a greve ilegal e a outra multando o Sindicato dos Policiais Civis do Estado do Maranhão (Sinpol) em R$ 10 mil em caso de descumprimento da decisão judicial.
Os policiais civis – aí incluídos investigadores, comissários, escrivães e peritos criminais – integram uma categoria essencial do serviço público, exatamente por representar a Polícia Judiciária, com a função de proteger o cidadão e a sociedade como um todo de todo crime, infração, agressão, etc. Não se discute, portanto, que, a começar pela natureza da atividade, o policial civil deva ser bem remunerado e estimulado por vantagens condizentes com as suas necessidades.
A Polícia, seja qual for o seu segmento, existe exatamente para garantir o cumprimento das leis que regem uma sociedade. É o braço do Estado como um todo com a função de investigar crimes de diferentes abrangências e gravidade e cumprir ordens judiciais contra os fora da lei, como é o caso da Polícia Civil, e de garantir a ordem pública e dar combate à violência, como é o caso da Polícia Militar. É, enfim, a instituição por meio da qual o Estado impede que a movimentação da sociedade se dê fora das regras. Daí não ser admissível que seus integrantes, alegando desacordo com o Poder Executivo por causa dessa ou daquela vantagem, simplesmente deflagrem um movimento grevista, afrontando as Constituições Federal e Estadual.
A greve da Polícia Civil do Maranhão é desdobramento torto da violenta e afrontosa paralisação da Polícia Militar em 2012. Quando, articulados por uma rede nacional de agitação, os PMs maranhenses se amotinaram, cruzaram os braços e foram para as ruas, muitos portando arma de fogo e se dizendo dispostos a tudo. Insuflados por deputados então na oposição – hoje são governistas e tentam controlar e minar o movimento – policiais militares se encastelaram na Assembleia Legislativa, de onde só saíram depois de um entendimento negociado pelo senador João Alberto (PMDB). E o clima de tensão só foi desfeito com a chegada da Força Nacional, que fez um bom trabalho de patrulhamento de rua, e nada mais.
Naquele movimento, os líderes tinham tanta certeza de que estavam na contramão da lei, que nas negociações um dos itens mais reivindicados foi a anistia. O governo, por sua vez, estava tão seguro de que a greve era delituosa que concedeu anistia em parte, e por isso vários ativistas respondem a processo até hoje.
Por mais injusto, desigual, maltratado, explorado e mal cuidado que seja, o Maranhão, queiram ou não alguns críticos da afirmação, vive hoje sob o estado democrático de direito pleno, assegurado pela Constituição Federal e pela Constituição do Estado e no qual um dos princípios é a liberdade de expressão e de manifestação. Só que há regras claras, e também exceções, e uma delas é que policial, seja militar ou civil, não pode fazer greve. E quando ele rompe essa norma e cruza os braços, aos olhos da lei se nivela com qualquer contraventor, infelizmente.
É claro que a razão e o bom senso mandam que o Governo do Estado, hoje comandado pelo governador Flávio Dino (PCdoB), ex-ativista político e ex-juiz federal, abra mão da cobertura legal e tente encontrar uma saída pela via da negociação com os grevistas. Mas sem perder a noção de que, ao fazer a concessão, também estará violando princípios da Carta Magna.
PONTOS & CONTRAPONTOS
Mão dura, pela regra
Ontem, por volta das 16 horas, o desembargador Cléber Carvalho bateu forte: confirmou a ilegalidade da grave, mandou os policiais civis voltarem imediatamente ao trabalho, determinou ao Governo do Estado descontar os dias parados dos salários dos grevistas e aumentou de R$ 10 mil para R$ 20 mil o valor da multa que o Sindicato da categoria terá de pagar por dia de paralisação. Todas as decisões da Justiça se baseiam na norma constitucional segundo a qual policial, seja ele civil ou militar, não pode fazer greve. Nenhum magistrado, por mais condescendente que possa ser, ignoraria essa proibição para aceitar a greve dos integrantes da Polícia estadual como um direito líquido e certo. E não o faz porque não reconhece o direito de os policiais reivindicarem melhorias, mas porque a regra é clara, e não considerá-la é crime.
São Luís, 04 de Agosto de 2015.