Poucas vezes uma disputa por cargos na Mesa Diretora da Assembleia Legislativa causou tantas interpretações e versões surpreendentes e sem sentido como a que está em curso para a definição do corpo dirigente da nova composição do parlamento maranhense, a ser empossada amanhã. Chama a atenção que a quase unanimidade dos observadores já assimilou, por exemplo, que a deputada Iracema Vale (PSB), escolhida da base governista com o aval do Palácio dos Leões, será eleita presidente da Casa na sessão de abertura dos trabalhos legislativos. E, mais ainda, que parte das teorias da conspiração formuladas até ontem à noite deu à disputa entre os deputados Rodrigo Lago e Ana do Gás, ambos do PCdoB, pela 1ª vice-presidência, a dimensão de um confronto que pode “afetar gravemente” a relação política do governador Carlos Brandão (PSB) com o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (PSB). O grau de criatividade dessas teorias conspiratórias é tamanho que alguns teóricos chegaram a formular o desfecho da peleja daqui a quatro anos, prevendo – acredite quem quiser – que o governador poderia até mesmo permanecer no Governo e não disputar a cadeira de senador, para prejudicar a candidatura do seu vice Felipe Camarão (PT).
O que está, de fato, acontecendo é o seguinte: assim como a presidência da Assembleia Legislativa caberá ao PSB, que saiu das urnas com 11 deputados estaduais, e eles indicaram a deputada Iracema Vale, que obteve também o aval do governador Carlos Brandão, que pertence ao partido, o cargo de 1º vice-presidente da Assembleia Legislativa deve ser preenchido pelo PCdoB, que elegeu cinco deputados estaduais, a segunda maior bancada, cabendo aos seus integrantes escolherem o nome. Eleito para o primeiro mandato, o deputado Rodrigo Lago se candidatou à 1ª vice, cargo para o qual a deputada reeleita Ana do Gás também se candidatou. Eles conversaram, mas não chegaram a um acordo. Não funcionou. Os cinco deputados estaduais do partido se reuniram e, por três votos (Rodrigo Lago, Othelino Neto e Júlio Mendonça) contra dois (Ana do Gás e Ricardo Rios), Rodrigo Lago foi o indicado perlo PCdoB. Só que Ana do Gás não aceitou a escolha da bancada, e mesmo diante de ponderações, decidiu sair com uma candidatura independente.
Para os teóricos da conspiração, o PCdoB, partido reconhecido por decisões firmes, perdeu a linha e passou a ser mandado pelo governador Carlos Brandão e pelo ministro Flávio Dino, os dois chefes maiores do PSB. Dizem que Rodrigo Lago segue a cartilha do ministro e Ana do Gás reza no missal do governador. Não se descarta a existência de simpatias, preferências até, mas imaginar um cenário em que o governador Carlos Brandão queira impor Ana do Gás em detrimento de Rodrigo Lago, afrontando Flávio Dino, ou que Flávio Dino quebre lança por Rodrigo Lago tentando impor sua vontade ao governador Carlos Brandão, criando um clima de guerra entre os dois, não faz sentido. A começar pelo fato de que a 1ª vice-presidência da Assembleia Legislativa no primeiro biênio dessa legislatura não tem a importância que muitos lhe estão atribuindo. Só para lembrar: somando todas as vezes que assumiu durante os cinco anos de presidência do deputado Othelino Neto, que termina hoje à meia-noite, o 1º vice-presidente, deputado Glaubert Cutrim (PDT), não passou dois meses no comando da Casa.
O governador Carlos Brandão e o ministro Flávio Dino são políticos maduros, experientes e inteligentes. É óbvio que, por mais ampla e sólida que seja a aliança que os liga, eles têm pontos divergentes, seja em matéria de gestão pública, seja no campo da visão política. E não surpreenderia se nas suas conversas sobre o futuro do Maranhão esses contrapontos se evidenciem. Mas, até onde o radar da Coluna alcança, diante dos enormes desafios que ambos têm pela frente, cujo enfrentamento se torna mais fácil com a soma de forças, seria no mínimo insensato que ambos partissem para uma medição de força por causa da 1ª vice-presidência da Assembleia Legislativa. Mais insensatos ainda seriam os dois deputados permitirem uma situação como essa. Vale anotar que o governador Carlos Brandão inicia seu segundo mandato com uma base de apoio declarada formada por pelo menos 30 dos 42 deputados, e que os 12 que não a integram declaradamente, não formam um bloco assumido de oposição.
Resumo da opereta: não há embate entre o governador e o ministro. Se não chegarem a um acordo, Rodrigo Lago e Ana do Gás entregarão ao plenário a decisão pelo voto. Quem ganhar leva, sem nenhuma dor de cabeça para a presidente Iracema Vale.
PONTO & CONTRAPONTO
Othelino Neto pode ser secretário em Brasília ou continuar deputado
Até ontem à noite, o presidente da Assembleia Legislativa, deputado reeleito Othelino Neto (PCdoB), cujo mandato termina à meia-noite de hoje, ainda não havia batido quanto ao seu futuro depois que for empossado no novo mandato amanhã. Nos bastidores, uma certeza, ele vai passar parte do seu tempo em Brasília dando suporte à sua mulher, Ana Paula Lobato, que assumirá o mandato de senadora da República pelo PSB tão logo o senador eleito Flávio Dino (PSB) seja empossado e se licencie para reassumir o comando do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
O que se diz, e ninguém contesta, inclusive ele próprio, é que o governador Carlos Brandão lhe ofereceu o comando da Secretaria de Representação do Maranhão em Brasília. Ele se licenciaria do mandato, seria o chefe da Representação, criaria uma rede de contados na Esplanada dos Ministérios e daria o suporte necessário à senadora Ana Paula. Há quem diga, por outro lado, que ele estaria inclinado a exercer seu novo mandato de deputado estadual, fazendo uma espécie de ponte-aérea entre São Luís e Brasília, o que, a princípio parece algo bem mais complicado.
O fato é que o deputado Othelino Neto tem pouco tempo para resolver se se licencia do mandato e se torna secretário de Estado trabalhando em Brasília, ou se exerce seu mandato da maneira como bem entender. É que o governador Carlos Brandão tem pressa na nomeação do novo chefe da Representação do Maranhão na Capital da República.
Estadão X Juscelino Filho: saia justa com emenda, mas imprecisões sobre posição na Câmara
Não há dúvida de que o jornal O Estado de S. Paulo colocou o deputado federal Juscelino Filho (UB), ministro das Comunicações do Governo Lula, numa saia justa e muito desconfortável ao revelar que, por meio do orçamento secreto, ele destinou emenda no valor de R$ 5 milhões, via Codevasf, para a construção de uma estrada que beneficia diretamente a Fazenda Alegria, de sua propriedade, no município de Vitorino Freire. Vai ter de explicar isso ao presidente Lula da Silva (PT), se não quiser ser fritado e descartado do comando do ministério, que é um dos mais importantes da Esplanada.
Denúncia à parte, cujo conteúdo parece indiscutível, a matéria do Estadão contém uma série de imprecisões em relação à posição do deputado Juscelino Filho e à origem da sua nomeação para o Ministério das Comunicações. Algumas delas:
1 – A matéria diz que Juscelino Filho, reeleito para o terceiro mandato federal, “foi um deputado do chamado baixo clero até no ano passado”. Não é verdade. Por razões que o tempo vai esclarecer, ele foi eleito pelo DEM em 2014, e desde que chegou à Câmara Federal, foi distinguido pelo seu partido com posições destacadas, principalmente em Comissões da Casa. No segundo mandato, ganhou a tarefa especial de ser o relator da revisão do Código de Trânsito, trabalho que lhe deu muita visibilidade. E mais recentemente, indicado por seu partido, Juscelino Filho foi eleito presidente do Conselho de Ética da Câmara Federal, um cargo normalmente ocupado por deputado do “alto clero”.
2 – Não é correto afirmar que o deputado federal Juscelino Filho “foi escolhido” pelo presidente Lula da Silva para ser ministro das Comunicações. Ele foi indicado para o cargo pela bancada eleita do União Brasil na Câmara Federal, sem o aval explícito da cúpula do partido. Evidente que o presidente Lula da Silva se informou sobre o parlamentar e o aceitou, mesmo sabendo, por exemplo, que ele votou no presidente Jair Bolsonaro (PL), sem fazer campanha ostensiva. A presença de Juscelino Filho no comando do Ministério das Comunicações não se deve, portanto, a qualquer relação com o fato de ser um político maranhense, mas sim ao poder de fogo da bancada do UB na Câmara Federal. Isso significa dizer que sua permanência no cargo estará diretamente relacionada com o posicionamento da bancada do União Brasil nas votações de interesse do Palácio do Planalto. Ou seja, se a bancada do UB corresponder, ele continua, se não, vai embora. Nada além disso.
São Luís, 31 de Janeiro de 2023.