Waldir Maranhão vive 13 horas de protagonismo, mas não suporta o peso das reações e revoga sua própria decisão

 

waldir interino
Waldir Maranhão cercado por jornalista quando ainda era o dono da situação

Não durou mais que 13 horas o rasgo de valentia e ousadia política e pessoal do presidente interino da Câmara Federal, deputado Waldir Maranhão (PP). Ele surpreendera o Brasil e o mundo no final da manhã de ontem ao divulgar a decisão de anular as sessões nas quais a Câmara aprovou autorização para o Senado examinar e instaurar ou não o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. No final da noite, depois de meio dia de muita agitação e uma série infindável de bordoadas que recebeu de deputados e senadores favoráveis ao impeachment, aliviadas pelos afagos dos parlamentares aliados da presidente da República, Waldir Maranhão ignorou todos os apelos e revogou a sua própria decisão, encaminhando ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ofício em que diz apenas o seguinte: “Revogo a decisão por  mim proferida em 9 de Maio de 2016, por meio da qual foram anuladas as sessões do plenário da Câmara dos Deputados ocorridas nos dias 15, 16 e 17 de Abril de 2016, nas quais se deliberou sobre denuncia por crime de responsabilidade número 1 de 2015”.

No primeiro momento, o episódio liderado do pelo presidente interino da Câmara Federal, deputado Waldir Maranhão (PP) deu-lhe espaço como um dos seus protagonistas do momento, ao lado do presidente afastado da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), do vice-presidente da República, Michel Temer, do presidente do Senado da República, Renan Calheiros (PMDB-AL) e outros parlamentares com participação importante na crise, com o deputado Rubens Jr. (PCdoB), por exemplo. A decisão que Waldir Maranhão tomou de reconhecer várias irregularidades no processo de impeachment durante na tramitação na Câmara Federal, e o pedido para o presidente do Senado suspender a tramitação e devolver o processo à Câmara Federal, a fim de que as irregularidades fossem sanadas, entraria para a crônica desse momento histórico como a mais ousada, surpreendente, improvável e corajosa de todas as atitudes que mexeram com o caso até aqui. A ação atropelou as controvérsias que o cercam, e ele, de maneira surpreendente, assumiu o protagonismo do processo, declarando, em meio a uma guerra de reações, que agiu “para salvar a nossa democracia”. No início da madrugada de hoje era apenas o político menor que muitos dos seus colegas apontaram durante o dia.

O que se viu ontem foi que a arrogância de muitos subestimou Waldir Maranhão, um deputado maranhense de aparência humilde, que muitos acreditavam não ter estatura para assumir o comando da Casa neste momento, e estavam certos. Waldir maranhão ostenta o rótulo de um político inteligente, com boa formação técnica e cultural, que foi reitor da Universidade Estadual do Maranhão por dois mandatos; que exerce o terceiro mandato na Câmara Federal, conquistados com boas votações; exibe também forte dose de esperteza, que vive às voltas com a Justiça Eleitoral e com a Justiça Comum por conta de supostas artimanhas no submundo. O seu mandato é seguro por uma liminar, já que ele não com seguiu até hoje explicar a origem de parte do dinheiro que bancou sua campanha; é acusado de manipular dinheiro de previdência em municípios e, mais recentemente, é apontado como um dos “18 do PP” que supostamente tiveram suas campanhas financiadas com dinheiro sujo do esquema do Petrolão e estão com a Operação Lava Jato nos seus calcanhares.

Mal recebida classificada de “brincadeira de mau gosto”, apontada como tentativa do presidente interino da Câmara de sair do anonimato, à medida que o dia foi avançando, a providência foi vencendo as reações debochadas e sendo avaliada como coisa série. Oposicionistas que antes a viram como um gesto tresloucado, passaram a vê-la como algo a ser levado em conta. Afinal, ele respondia a ofício assinado pelo presidente da Comissão Especial do Impeachment no Senado, senador Raimundo Lira (PMDB-PB), para atender a questão de ordem levantada pela senadora Gleisi Hoffmann na primeira reunião da Comissão especial do Impeachment no Senado. O experiente deputado amazonense Paudernei Avelino, que lidera o DEM na Câmara Federal, reagiu com brados indignados dizendo que pedirá a cassação do presidente interino da Câmara, como se ele tivesse cometido um crime hediondo. No Senado, o tucano mineiro José Perrella (PSDB), conhecido pelos negócios escusos que mantém a Polícia no seu encalço, e o tragicômico goiano Ronaldo Caiado (DEM), que vive obcecado pela ideia de liquidar o PT, deram declarações duras, mas preconceituosas e ofensivas, contra Waldir Maranhão. Aliados da presidente Dilma, que passaram a devotar respeito a Waldir Maranhão desde que ele votou contra o impeachment, reagiram e exigiram tratamento decente e respeitoso ao presidente interino da Câmara. Mas no final da noite receberam uma poderosa ducha de água fria com o recuo do presidente.

Formalmente, o presidente Waldir Maranhão tomou sua decisão monocraticamente. Mas óbvias as digitais do governador Flávio Dino nos seu histórico e ousado movimento. E as do competente advogado geral da União, José Eduardo Cardoso, que defende a presidente Dilma no caso. Eles viram no recurso não respondido por Eduardo Cunha a brecha que a defesa precisava para, se não descarrilar de vez, pelo menos frear a locomotiva do impeachment que segue célere no Senado. O otimismo cresceu quando correu a certeza de que a nota divulgada pelo presidente interino da Câmara teve o aval político do governador maranhense, de quem é aliado de primeira hora. Sua segunda decisão sufocou esse estado de ânimo.

A boa vontade pode levar em conta é o fato de que Waldir Maranhão topou assumir os riscos e as consequências, e independente das motivações que o embalaram, ele se dispôs e enfrentar uma maioria enraivecida na Câmara. Não segurou a barra, e preferiu tentar garantir uma interinidade confortável, que poderá até se prolongar por todo o final do mandato da atual Mesa Diretora, em fevereiro do ano que vem. Iniciou o dia tentando fazer o que políticos de estatura fazem: saiu da zona de conforto e foi para a briga para ganhar ou perder. O ofício encaminhado ao presidente do Senado abalou quebrou a certeza de que da oposição de que a queda da presidente Dilma é fato consumado. Certo ou errado na resposta que deu ao recurso da defesa da presidente, o fato é que Waldir Maranhão recolocou o caso na ciranda da política, reabrindo assim o debate.  E se de fato contou com o apoio do governador Flávio Dino na escala em que estão afirmando, fez melhor do que se estivesse agindo como pau mandado de Eduardo Cunha, o seu “presidente querido”. Afinal, o governador maranhense é respeitado, foi juiz federal, é professor de direito constitucional, ex-deputado federal e dono de vida ilibada, enquanto o presidente afastado da Câmara pode ser definido com uma palavra: mafioso. Mas jogou a toalha quando sentiu o peso da decisão e previu suas consequências.

Todos avaliavam que depois da reação do presidente do Senado, Renan Calheiros, de não acatá-la, a decisão de Waldir Maranhão de anular a sessão em que a Câmara Federal autorizou o Senado a admitir ou arquivar o pedido de impeachment dificilmente suspenderia o processo em andamento. Só não esperavam que, depois da primeira nota e do comunicado do final da tarde, nada abalaria sua convicção de que estava salvando a democracia. Mas tudo veio por água abaixo no final da noite com o recuo e a diminuição do tamanho do protagonista.

 

PONTO & CONTRAPONTO

“Meu aguardem”

“Vocês vão se surpreender”. A frase, em tom que misturou promessa com advertência, foi dita pelo deputado federal Waldir Maranhão a jornalistas que deixavam clara sua incerteza quanto á capacidade de ele assumir as rédeas da Câmara Federal na ausência do esperto, competente e mafioso deputado Eduardo Cunha, a quem substituiu. No final da semana passada, Maranhão dedicou boa parte do seu tempo a montar uma estratégia para mostrar que não era o membro do baixo claro que chegou ao topo sem saber o que fazer. O recurso da AGU esnobado por Eduardo Cunha foi o presente do Céu almejado pelo substituto. Waldir Maranhão fez consultas em todas as direções e chegou à conclusão de que valeria a pena esticar a corda. O aval do governador Flávio Dino era tudo o que ele precisava para fortalecer a certeza de que estava no caminho certo. As reações dos adversários mostraram que ele não seguraria.

 

Contra e a favor

O movimento do presidente interino Waldir Maranhão dividiu a bancada maranhense na Câmara Federal. De um modo geral, os apoiadores do impeachment da presidente Dilma Rousseff se posicionaram contra a decisão de anular a sessão do dia 17 de abril e, com isso, estancar o processo de impeachment no Senado. A crítica mais dura partiu exatamente do deputado Hildo Rocha (PMDB), que segue rigorosamente a cartilha da ex-governadora Roseana Sarney. Rocha classificou de “estúpida” a decisão de Maranhão. Na contrapartida, o deputado Rubens Jr. (PCdoB), defendeu a iniciativa, afirmando que o presidente interino da Câmara agiu com isenção e com responsabilidade pública. Os primeiros tinham razão.

 

São Luís, 09 de Maio de 2016

 

 

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