Se, de fato, o ex-deputado e ex-secretário de Estado da Saúde Ricardo Murad (PMDB) vier a cair nas malhas da Justiça por causa de até agora supostos desvios na gestão do megaprograma Saúde é Vida, como vem sendo acusado pelo Governo Flávio Dino por meio da Secretaria de Transparência e Controle, comandada pelo advogado Rodrigo Lago, cedo ou tarde oficiais de Justiça irão tocar a campainha da residência da ex-governadora Roseana Sarney (PMDB), maior responsável pelas ações do seu governo. Roseana está para a ação contra Murad como a presidente Dilma Rousseff (PT) está para o esquema de corrupção descobertos pela Operação Lava Jato: se efetivamente ocorreram – falta provar -, as supostas e denunciadas bandalheiras aconteceram na sua gestão.
Tal condição não significa que a ex-governadora possa ter tido alguma participação ou conhecimento dos fatos a serem passados a limpo, mas a distância não a isenta da responsabilidade direta pelo que possa ter acontecido nas entranhas do seu governo, durante a execução do programa Saúde é Vida, que ela tanto vendeu ao mundo como a grande maravilha da sua gestão.
Ao longo dos seis anos e oito meses de governo, ficou evidente que Ricardo Murad foi um secretário diferenciado, não somente pelo seu estilo arrojado, do “quero, posso e faço”, o que lhe valeu o apelido de “Trator”. Era sabido, dentro e fora do governo, que ele trabalhava de acordo com as suas próprias regras, coisas do tipo acordar cedo e não ter hora para dormir, tirar o sono e o equilíbrio emocional dos seus auxiliares pelo tom implacável das cobranças por resultados, usar todos os recursos possíveis – a começar por helicópteros, sem se preocupar com os custos – para manter uma verdadeira maratona de deslocamentos pelas mais diferentes regiões do estado, entre outras condições não proporcionadas a outros secretários. O gigantismo do programa Saúde é Vida, iniciado em 2009, de alguma maneira justificava tais condições, mas dentro do próprio governo havia quem criticasse duramente a desenvoltura do secretário de Saúde.
Não foram poucas vezes em que vozes adversárias e manifestações de “fogo amigo” criticaram com veemência o tratamento especial que a governadora Roseana Sarney dispensava ao secretário da Saúde, se comparado ao dos demais membros da equipe. Mas as críticas eram amenizadas com o argumento de tratar-se do seu cunhado, parceiro político que já estivera na oposição, e como um quadro com capacidade administrativa para tocar programa tão audacioso. A complacência era também justificada pelo fato de Murad ser um dos articuladores políticos do governo e do grupo político, com habilidade até para resolver assuntos – alguns gravemente problemáticos – que nunca chegaram à superfície. Daí a liberdade total dada ao secretário de Saúde, que na contrapartida vinha dando conta do recado, não se sabe a que custo.
O fato indiscutível é que se coisas erradas foram feitas na gestão do Sistema Estadual de Saúde durante os dois últimos governos de Roseana Sarney, ela tem responsabilidade direta. Primeiro porque não é admissível, em qualquer situação ou circunstância, que um chefe de governo delegue tantos poderes a um secretário, independente dos laços pessoais e políticos que os ligue. E se coisas erradas aconteceram e ela não teve conhecimento, corre o risco de ser acusada de falta de responsabilidade e de interesse pela coisa pública. No caso do secretário Ricardo Murad, a governadora delegou-lhe poderes para gastar mais de R$ 1 bilhão. Não havia controle interno? Tais gastos não eram explicados em relatórios? São algumas das muitas indagações que poderão ser formuladas na hipótese de as denúncias e acusações feitas pelo atual governo sejam provadas por seus acusadores, no caso atual governo estadual, cujo responsável maior é o governador Flávio Dino.
Chama a atenção o fato de que a ex-governadora Roseana Sarney vem mantendo distância e silêncio em relação ao furacão que envolve o ex-secretário da Saúde. Provavelmente orientada por conselheiros experientes, avalia cada movimento na direção de Ricardo Murad, certamente se preparando para dispor de argumentos fortes e convincentes, caso os oficiais de Justiça toquem a campainha da sua residência.
PONTOS & CONTRAPONTOS
Nova acareação
O juiz Sérgio Moro, comandante da Operação Lava Jato, autorizou a CPI da Petrobras a realizar nova acareação entre o ex-diretor de Abastecimento e chefe do esquema de corrupção na petroleira, Paulo Roberto Costa, e o doleiro e distribuidor da grana roubada Alberto Yousseff. A acareação será realizada no dia 25, e entre as dúvidas a serem resolvidas está a contradição no que respeita o envolvimento da então governadora Roseana Sarney. Nos seus depoimentos ao juiz Sérgio Moro e nas acareações que fez com o doleiro, Costa afirma que mandou-o repassar R$ 2 milhões à Roseana para a campanha de 2010. Yousseff nega que tenha recebido tal orientação e diz que não fez tal repasse. É quase certo que a deputada federal Eliziane Gama (PPS), membro da CPI, indague os dois sobre esse tema.
São Luís, 15 de Agosto de 2015.