Causou forte impacto no meio político e nos mais diversos segmentos da magistratura a decisão de Márlon Reis de abrir mão do cargo vitalício de Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Maranhão para voltar às lides da advocacia e, segundo alguns, entrar com os dois pés na seara política, podendo, sugerem especulações, concorrer a uma cadeira no Senado em 2018. A iniciativa do magistrado nascido no Tocantins, mas crescido, formado e concursado no Maranhão, faz todo sentido, a começar pelo fato de que a condição de Juiz no interior maranhense, por mais nobre e importante que seja, tornou-se um fator de limitação para uma personalidade cuja atuação ultrapassou, faz tempo, as fronteiras do estado e ganhou projeção nacional e internacional como um dos articuladores do movimento que mobilizou milhões de brasileiros e resultou na aprovação da Lei Complementar Nº 101, de 2000, conhecida e notabilizada como Lei da Ficha Limpa, o mais importante instrumento de combate à corrupção eleitoral em vigor no Brasil. Respeitado nos meios jurídico e judiciário e referência de organizações e entidades civis voltadas para o combate à corrupção, Márlon Reis ganhou o respeito de boa parte da classe política com atuação saudável, mas também é visto como o inimigo visceral de uma grande turma que odeia e faz de tudo para driblar a Lei da Ficha Limpa.
Membro destacado de uma geração de militantes estudantis que saíram do Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão, fizeram carreira na magistratura ou na advocacia e acabaram na linha de frente das lutas políticas, como o governador Flávio Dino (PCdoB), ou fizeram o caminho inverso, como o promotor de Justiça Juarez Madeiros – como anotou correta e oportunamente o bem informado jornalista Marcos D`Eça no seu blog -, Márlon Reis deixou claro que seria um juiz militante desde que iniciou sua carreira na magistratura. E já nos primeiros movimentos mostrou que empreenderia uma cruzada contra a corrupção eleitoral.
Poucos deram importância a uma notícia publicada por O Estado em meados dos anos de 1990 do século passado, que registrava uma ação inédita e curiosa do então jovem juiz Márlon Reis, então titular da Comarca de Alto Parnaíba. Era período pré-eleitoral para as eleições municipais de 1996, Márlon Reis comandava a zona eleitoral da região. Indignado com relação de troca – sandálias de plástico, camisetas de malha ordinária, dentadura, óculos, outros objetos e também promessa de dinheiro – que constatou naquele período, juiz resolveu quebrar a regra do não envolvimento, e iniciou um movimento em sentido contrário: passou a reunir eleitores em pequenos comícios, nos quais pregava contra a troca eleitoral, mostrando que o voto é o mais importante instrumento do cidadão para transformar a sociedade numa democracia. O relato do jovem juiz aos jornalistas de O Estado, numa visita noturna, foi transformado em matéria e publicado. Márlon Reis em seguida escreveu vários artigos sobre o movimento. Não tardou para que seu trabalho atraísse a ira dos políticos que usavam velhos métodos naquela região, como também a atenção de órgãos de imprensa do Sul do país, como os jornais O Globo, Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo e Jornal do Brasil.
A atuação do jovem magistrado repercutiu bombasticamente no Tribunal de Justiça. A magistratura – aí incluídos desembargadores e juízes – se dividiu, com um grupo censurando-o fortemente – uns chegaram a cobrar punição severa –, outro a seu favor, defendendo-o das críticas, e no meio uma maioria silenciosa aguardando o desfecho. Márlon Reis foi várias vezes chamado às falas, mas nunca deu maior importância para elas, preferindo capitalizar a seu favor o prestígio que começou a desfrutar no âmbito nacional. O juiz de comarca do interior de repente passou a ser convidado para entrevistas, palestras, conferências, debates nos grandes centros, aproveitando a para fazer contatos e tecer uma rede de relações que alcançou os mais elevados patamares da Justiça, que se consolidou quando ganhou o conceituado Prêmio Innovare, que reconhece ações originais voltadas para melhorar a sociedade e a cidadania.
O que veio depois disso, todos conhecem: assessor da presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), assessoria no Superior Tribunal de Justiça (STJ), trabalhos prestados ao Supremo Tribunal Federal (STF), assistência ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mestrado e doutorado em Direito Eleitoral e, finalmente, a sua mais importante ação como magistrado militante: o movimento popular para levar ao Congresso Nacional o Projeto da Lei da Ficha Limpa, destinado a sanear o processo de candidatura a cargo eletivo com a proibição de políticos encalacrados com a Justiça de disputar votos. A lei foi aprovada e contribuiu fortemente para melhorar o sistema eleitoral brasileiro, já tendo barrado mais de 1.200 candidatos “ficha suja” desde que entrou em vigor. A partir dessa conquista, Márlon Reis virou uma respeitada da moralidade política no país, festejado por muitos e odiado por um bom número; ganhou status de celebridade e chegou a ser incluído em várias listas dos 100 brasileiros mais influentes publicadas por diversas revistas.
Passado o boom do prestígio – que se manteve alto, diga-se -, Márlon Reis teve de retornar à labuta no interior como titular da Comarca de João Lisboa, atuando junto com sua mulher, também juíza e titular da vara Cível de Imperatriz. Na gestão da desembargadora Cleonice Freire, ocupou um cargo de assessoria no Tribunal de Justiça. Foi quando ficou claro que, por tudo o que realizou com a sua militância, a magistratura do Maranhão ficou pequena para seu espaço de atuação. Continuar juiz, se conformar com a rotina e com a perspectiva de um dia chegar a desembargador seria limitar seus movimentos. Abrir mão da estabilidade e recomeçar do zero com um escritório de advocacia em Brasília especializado em direito político, com foco no direito eleitoral, já tendo a Rede Sustentabilidade, partido de Marina Silva como cliente, é um sinal claro de que a especulação da candidatura ao Senado faz todo sentido.
PONTO & CONTRAPONTO
Saúde
Sai Marcos Pacheco
A mudança no comando da Secretaria Estadual de Saúde eram favas contadas há algum tempo. O médico, advogado e professor Marcos Pacheco, uma figura respeitada por sua correção pessoal e pelo seu engajamento político, não tem, de fato, perfil para encarar um desafio do tamanho do Sistema Estadual de Saúde, principalmente como sucessor do ex-deputado Ricardo Murad (PMDB), que impôs ali a sua conhecida, controvertida, mas eficiente, dinâmica “tratoral”. Embalado pelas melhores intenções, mas sem a garra do gestor que impõe ritmo convincente a uma máquina cujo objetivo é dar-lhe o máximo de eficiência, Marcos Pacheco não conseguiu domar o sistema. É verdade que colocou ordem na complexa situação deixada pela gestão anterior, mascada por projetos bem sucedidos, mas também por grande número de obras inacabadas, contas para pagar, mas com a vantagem um bom saldo na conta do empréstimo bilionário contratado pelo Governo anterior com o BNDES. Não se duvida de que a pasta da Saúde estava em boas mãos, mas estava cada vez mais claro que o Governo estava perdendo terreno nessa área, exatamente pela lentidão ali imposta, principalmente se comparada com o ritmo acelerado da gestão passada. A troca, portanto, não se deu por uma questão de competência, mas de modus operandi. Tanto que não houve drama. Marcos Pacheco certamente já estava incomodado com cobranças internas e externas e deve ter colocado seus termos para o governador Flávio Dino, chegando com ele a um entendimento sobre o futuro da pasta. Tanto é que fez questão de seguir ontem para Brasília, para negociar recursos para a pasta, só devendo passar o cargo na sexta-feira. Deve continuar auxiliando o governador.
Entra Carlos Lula
O Sistema estadual de Saúde será comandado pelo Carlos Lula, um jovem advogado bem sucedido, especializado em Direito Eleitoral, mas também focado em gestão pública. Já no cargo de secretário-adjunto de Saúde e na presidência de uma estatal que cuida das relações do Governo com cooperativas médicas, Carlos Lula é exatamente o oposto de Marcos Pacheco: é dinâmico e arrojado, com o perfil de gestos que gosta de encarar desafios e de produzir resultados. Membro do alto clero do atual Governo, com papel importante exercido durante a campanha eleitoral como chefe da assessoria jurídica, Carlos Lula ganhou, certamente por seu perfil, um “presente” do governador Flavio Dino: ser o braço administrativo da pasta da Saúde. O governador sabia o que estava fazendo, pois enquanto a macropolítica de saúde caminhava correta, mas lenta, Carlos Lula atuava fortemente nas áreas de gestão, disciplinando o funcionamento de hospitais, adequando os gastos, cortando excessos, enfim, colocando a casa em ordem. Ontem, quando foi anunciado como novo secretário de Saúde, algumas vozes ensaiaram discurso da surpresa, usando principalmente o argumento de não ser ele um médico. A ascensão de Carlos Lula ao cargo de secretário de Estado da Saúde foi a sua eficiência e os bons resultados da sua gestão, o que reforça o argumento de que grandes secretários de Saúde eram médicos, como João Abreu e Ricardo Murad em Governos de Roseana Sarney, e o maior de todos os exemplos: o tucano José Serra, que não tem qualquer ligação com a medicina, surpreendeu o Brasil como ministro da Saúde. E outros exemplos no próprio Governo Flávio Dino: Felipe Camarão, que é administrador e sua relação sempre foi com a escola privada. está dando um baile de gestão na área de Educação; e Clayton Noleto, que não é engenheiro mas tem recebido elogios por seu desempenho elogiado no comando da pasta da Infraestrutura. Há 16 meses administrando crises e carências, Carlos Lula está mais do que credenciado para comandar a pasta.
São Luís, 26 de Abril de 2016
retificar a lei complementar citada na matéria que trata sobre o Juiz Marlon Reis , onde lê-se 101/2000 leia-se 135/2010