De todas as Prefeituras maranhenses que mudarão de mãos na virada do ano, a mais importante é, sem qualquer traço de dúvida, a de Imperatriz, responsável que é pela gestão do segundo maior e mais destacado centro urbano do Maranhão, que abriga atualmente uma população de aproximadamente 260 mil maranhenses naturais e adotivos, com forte poder de fogo econômico, que nasceu vocacionada para ser capital de um futuro estado, tanto que já funciona como metrópole. Imperatriz foi palco do mais surpreendente desfecho da corrida às urnas: Assis Ramos (PMDB), um delegado de Polícia que falou a língua do povo, atropelou o influente e poderoso ex-prefeito Ildon Marques (PSB), apoiado pelo senador Roberto Rocha (PSB), a animada Rosângela Curado (PDT), candidata embalada pelo Palácio dos Leões, e o vereador Ribinha Cunha (PR), empresário conhecido e lançado tardiamente pelas mãos do prefeito Sebastião Madeira (PSDB). O prefeito eleito vai receber do atual uma Prefeitura completamente diferente da que ele recebeu há oito anos, tempo que durou uma gestão no mínimo correta no trato com os recursos públicos.
Em tempo de transição, quando os prefeitos eleitos são atraídos por reuniões partidárias e por seminário na Famem em busca de informações técnicas que lhes auxiliem pelo menos nos primeiros passos, e levando em conta a situação dramática das finanças públicas, Assis Ramos já sabe que receberá não exatamente um presente, mas assumirá o comando de uma máquina municipal saneada, azeitada do ponto de vista administrativo, com os compromissos em dia e a possibilidade concreta de seguir em frente sem maiores traumas. É claro que o prefeito eleito encontrará problemas, mas todos eles, ou pelo menos os mais graves, estarão devidamente equacionados, com soluções alinhavadas, precisando apenas de tempo e recursos para serem resolvidos. Não se diga que nos oito anos do prefeito Sebastião Madeira Imperatriz foi transformada numa versão urbana do paraíso, mas é verdade que mesmo seus adversários mais ranzinzas, ainda que discordando do que veem, reconhecem que o prefeito que está de saída deixará para seu sucessor uma máquina controlada e em pleno funcionamento.
Aos 67 anos, com quatro mandatos de deputado federal, tendo se tornado figura de peso dentro do PSDB, o médico Sebastião Madeira é apontado por aliados como um sobrevivente que soube se equilibrar politicamente no comando do segundo maior município do Maranhão, cercado de adversários por todos os lados. Assumiu em 2009 para conviver com o governo Roseana Sarney – que assumiu com a cassação do governador Jackson Lago – para logo enfrentar o peso da hostilidade política, obrigando-o a usar toda a sua habilidade para construir a ponte que o levaria a uma convivência institucional produtiva com o Palácio dos Leões. A ponto de em 2014 declarar apoio ao então candidato do PMDB ao Governo do Estado, Luiz Fernando Silva (PMDB). Com a desistência do pemedebista, Sebastião Madeira declarou apoio à candidatura do então deputado federal Flávio Dino (PCdoB), que se elegeu e com quem construiu uma relação administrativa produtiva, mas de altos e baixos no campo da política.
(Nas montagens para as eleições municipais, Sebastião Madeira acreditou na possibilidade de uma aliança com Flávio Dino em torno de um candidato à sua sucessão. O PDT, porém, impôs a candidatura de Rosângela Curado, fechando todas as portas para um entendimento com o prefeito. Correndo o risco do isolamento, Madeira usou sua experiência e tarimba e entrou na briga, lançando, já quase fora de tempo, o vereador Ribinha Cunha, que começou com menos de 2% na preferência do eleitorado e acabou com 20%, em quarto lugar, mas bem próximo dos demais. O resultado foi claro: se o Palácio dos Leões tivesse tido Madeira como aliado, o resultado do pleito teria seria outro.)
O Madeira político bem sucedido tem sido também o gestor de bons resultados. O político soube construir um lastro que agora trabalha no desafiador projeto de chegar ao Senado em 2018. E o gestor que fez a administração com os pés no chão e cujos resultados são indiscutivelmente positivos. Uma boa fonte para o iniciante Assis Ramos beber, se tiver mesmo o bom senso que parece ter.
PONTO & CONTRAPONTO
A tragédia política e moral do Rio de Janeiro I
O Brasil assistiu atônito, nesta semana, dois ex-governadores do Rio de Janeiro ser presos por corrupção. O primeiro foi Anthony Garotinho (PR), 56 anos, que teve tudo para ser um político com uma história invejável. O segundo foi Sérgio Cabral Filho (PMDB), que poderia ter chegado ao Palácio do Planalto. Garotinho escalou os degraus da política fluminense na esteira do brizolismo, revelando-se desde logo um político ousado mas pouco confiável. Foi prefeito de Campos, governador, fez a mulher, Rosinha, prefeita e governadora, foi candidato a presidente da República, mas suas estripulias vieram à tona e ele acabou exilado em seu reduto, atualmente como secretário-chefe do governo da mulher. Sua prisão não surpreendeu, e as imagens da sua transferência de um hospital para o Complexo Penitenciário de Bangu, tumultuada pelo desespero da filha, a deputada federal Clarisse Garotinho (PR) e a desolação da mulher, não só causaram o efeito de uma tragédia familiar, como decretaram a sua morte política. Nenhum analista, por mais pragmático e isento que seja, se arriscará a prever que a família Garotinho tem algum futuro na política do Rio de Janeiro.
A tragédia política e moral do Rio de Janeiro II
Sérgio Cabral, 54 anos, construiu uma carreira tão bem sucedida que chegou a ser tratado como um dos membros do PMDB com chance concreta de vir a ser candidato à presidente da República. Menino classe média de Copacabana – depois se mudou para Ipanema -, ascendeu como o nome mais brilhante da sua geração, alcançando três mandatos de deputado estadual, um de senador e dois de governador. As investigações mostraram agora que Cabral era um político bandido, que se deixou fascinar pelo dinheiro fácil, por jóias, mansões, helicóptero, restaurantes parisienses caros bancados por desvios por ele comandados em relações promíscuas com empresários da construção civil. A prisão e sua imagem com roupa de presidiário funcionaram ontem como uma guilhotina politica, encerrando sua vida política e tornando-o uma espécie de pária. O maior impacto desse desfecho certamente está sendo sofrido pelo seu pai, que lhe deu o nome, Sérgio Cabral, jornalista e vereador carioca por três mandatos, que honrou o jornalismo e a política. Sérgio Cabral começou como repórter policial, cobriu política e dirigiu jornal, deixando um legado rico e qualidade e decência profissionais. O seu legado mais luminoso foi ter sido um dos fundadores do Pasquim, ícone maior do jornalismo alternativo nos anos 60 e 70 e que foi a voz irreverente do Brasil que resistia à ditadura militar. Sérgio Cabral também foi preso, só que o motivo da prisão foi a sua decência política na luta inteligente contra a opressão. Outra fatia do seu legado foi como critico musical e pesquisador da MPB, especialmente o samba carioca. Nessa tarefa redescobriu o compositor Cartola, então vigia de carros no estacionamento de um prédio o centro do Rio. Com a descoberta de Sérgio Cabral, Cartola saiu do anonimato enriqueceu o cancioneiro popular e presenteou o Brasil com joias como “O mundo é um moinho”, “As rosas não falam”, “Sala de recepção”, “Tempos idos”, “Peito vazio”, “Cordas de aço” e muitas outras. E finalmente a fatia política do seu legado: três mandados de vereador no Rio de Janeiro, cumpridos sem uma mancha, o que lhe valeu uma cadeira no Tribunal de Contas do Estado, que exerceu até se aposentar em 2007. Tudo isso além de uma vasta bibliografia sobre a MPB. Esse homem, reverenciado no jornalismo, na música e na política, caminha para o fim dos seus dias moralmente afetado pelo banditismo do filho.
São Luís, 18 de Novembro de 2016.