A busca da paz não é uma atitude exclusiva de chefes de Estado ou chanceleres que representam o circuito das grandes potências e as suas áreas de interesse ao redor do planeta, onde alimentam e eliminam conflitos de acordo com as suas conveniências e os seus interesses, agindo raramente para garantir a paz no sentido mais amplo do termo. Essa busca é feita também por inúmeras organizações civis internacionais, que se dedicam a combater e denunciar em escala global regimes que se impõem pela opressão, por governos ditatoriais, que se valem da força para reprimir, censurar e oprimir, principalmente no chamado Terceiro Mundo. Com a altivez de quem detém o título de Cidade Patrimônio Cultural da Humanidade, São Luís vive uma semana como epicentro de um debate mundial pela paz, ao sediar a Conferência do Conselho Mundial da Paz, uma entidade de alcance internacional fundada em 1949 e que se reúne a cada quatro anos em país diferente, sendo a primeira vez que realiza o seu evento no Brasil, um dos 90 países filiados, sendo nele representado pelo Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz), que realizou sexta-feira sua 4ª Conferência.
Os eventos contam com o apoio do Governo do Estado, o que sugere a indagação: o que tem o Maranhão a ver com um movimento pela paz mundial? Visto por uma perspectiva fechada, provinciana, quase nada; mas olhada por um plano politicamente mais aberto, levando em conta a situação dos povos que vivem no fogo cruzado dos interesses das grandes potências, a realização do evento em São Luis faz todo sentido. O secretário de Comunicação e Articulação Política, Márcio Jerry, que preside o PCdoB, justifica a realização do evento em São Luís com o apoio do Governo do Estado: “É importante por ser organizado pela sociedade civil e contribui para que o Maranhão seja inserido nos debates em favor da paz nacional e mundial, e soma para referenciar cada vez mais o estado como importante destino turístico de eventos. Isso faz com que os olhares do mundo se direcionem para cá e reforça nosso potencial, nossas riquezas econômicas e culturais e para a economia do turismo e região importante para o país e o mundo”.
De acordo com a visão do Governo, que é essencialmente a visão do governador Flávio Dino, independente de ser apenas uma unidade da Federação Brasileira, sem política externa própria, o Maranhão deve cultivar relações com o mundo, principalmente com povos que ainda sofrem com a opressão e estão submetidos a jogos de interesses das grandes potências, como é o caso da Síria, que já perdeu mais de 400 mil vidas num conflito insano; dos curdos, que já são organizados uma nação, mas enfrentam a má vontade da Turquia; dos palestinos, que não instalam um país porque Israel não deixa; de afegãos, iraquianos e líbios; das minorias que são oprimidas em todo o mundo, como índios, negros, asiáticos, latinos, entre muitas outras espalhadas pelos mais diferentes rincões do planeta. E nesse contexto, situações de instabilidade política e ameaças à democracia na América do Sul, como é o caso da Colômbia, Venezuela, Bolívia e Equador, além de monitoramento da situação em Honduras e Paraguai.
Plenamente identificado com essa linha de ação política, o governador Flávio Dino prega “a resistência, a firmeza de propósitos e o compromisso com a mudança destas realidades opressoras”. Observa que o Brasil “vive um momento de desigualdade social e perda da justiça, o que favorece a negação da paz propiciando a intolerância e o ódio”. E arremata: “Uma das consequências desses sentimentos é o belicismo, a guerra. O Brasil também sente a crise do capitalismo, fruto da concentração de riquezas nas mãos de poucos”. Na sua fala na conferência da Cebrapaz, no Hotel Luzeiros, Flávio assinalou que o projeto do seu governo está focado na diminuição das desigualdades, incrementando a retórica anti-imperialista. “Por isso, aceitamos esse convite do Cebrapaz para somar às causas da paz, contra o imperialismo e por um mundo mais justo para todos”.
Desde que assumiu, em janeiro de 2015, o governador Flávio Dino vem estimulando a construção de um viés internacional para o seu Governo, defendendo nesse plano ações destinadas a promover a cultura da paz e a defesa dos direitos humanos. Tanto que editou a Lei Estadual nº 10.387, de dezembro de 2015, que instituiu o Pacto pela Paz. A lei estadual estimula o debate, a reflexão e a atuação em busca de uma cultura de paz entre os povos e nações, que são também os objetivos centrais do Conselho Mundial da Paz (CMP). A 4ª Assembleia Nacional do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz) versou sobre esses temas, dentro da linha do “Novembro Pela Paz”, instituído pelo Governo do Estado, o que explica a escolha do Maranhão por ser uma unidade política e cultural estratégica para debater questões latentes como direitos humanos, racismo, desigualdades sociais e econômicas, religião entre outros temas relacionados à paz. Representantes de todos os estados brasileiros e de todos os continentes participam para colaborar com o diálogo e a construção do Conselho Mundial da Paz.
De acordo com o Secretário de Comunicação e Assuntos Políticos, Márcio Jerry, que é militante de movimentos sociais estado, receber um evento como este torna o Maranhão uma referência no debate sobre a paz mundial. “O governo do Estado do Maranhão e as comitivas que estarão aqui presentes durante as assembleias e conferência irão somar e acolher pautas e discussões importantes para o mundo. Nosso objetivo é atingir o respeito entre os povos e criar uma cultura de paz mundial por meio do diálogo”, reiterou o secretário.
As atividades do Conselho Mundial da Paz acontecem em São Luís concomitantemente à programação do ‘Novembro Pela Paz’, um mês destinado à promoção da cultura de paz entre as comunidades, em que o governo do estado, por meio da Secretaria de Direitos Humanos e Participação Popular (Sedihpop) e parceiros desenvolvem diversas ações e atividades visando estimular uma melhor convivência e respeito entre os maranhenses. Militante ativo dessas causas, Francisco Gonçalves, Secretário de Direitos Humanos e Participação Popular, concorda que o Maranhão está inserido no debate nacional e internacional de questões como a paz mundial. “Todas as atividades que estão acontecendo no Maranhão, neste momento, irão somar. A nossa ideia não era apenas acolher o evento nacional e internacional, mas aproveitar o momento para pautar temas importantes para nós maranhenses”, assinalou Gonçalves, cuja pasta trava uma verdadeira guerra contra a miséria e a pobreza nos municípios com menor IDH, apoiado por Gerson Pinheiro, secretário de Igualdade Racial.
Em Tempo: A Conferência Mundial da Paz será realizada hoje, das 8 horas às 15 horas, no Teatro Arthur Azevedo, São Luís, Maranhão, Brasil.
PONTO & CONTRAPONTO
São Luís na rota dos eventos internacionais
Situado na fronteira do Nordeste com o Norte, o Maranhão sempre esteve fora do circuito internacional de eventos. Tal situação sofreu uma mudança radical quando José Sarney (PMDB) foi presidente da República. O primeiro evento aconteceu em 1989, quando São Luís sediou a reunião de chefes de Estado de países de língua portuguesa, recebendo os líderes de Portugal, Angola, Moçambique, Guiné-Bissal, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe. Sob o comando de José Sarney, a reunião foi realizada no Palácio dos Leões e ganhou repercussão mundial, principalmente por ter dado origem à formação da Comunidade de Língua Portuguesa e cujo efeito prático foi o acordo para a unificação da língua, que foi firmado mais de duas décadas depois. Sarney trouxe ainda para São Luís o presidente Juan Maria Sanguinetti (Uruguai) e o presidente Virgílio Barco (Colômbia). O último e mais estridente evento de natureza internacional aconteceu em 2008, quando o coronel Hugo Chávez, então presidente da Venezuela, desembarcou em São Luís atendendo a convite do então governador Jackson Lago (PDT), que o recebeu no Palácio dos Leões e condecorou-o com a Ordem dos Timbiras como um grande líder. A Conferência do Conselho Mundial da Paz, portanto, se encaixa nesta lista de eventos que colocaram o Maranhão no plano internacional.
Reativado o núcleo pela paz no Maranhão
O comprometimento do Governo do Maranhão com o movimento pela paz apoiando a realização do evento em São Luís resultou na reativação de um núcleo da Cebrapaz no estado, que estava fechado há seis anos. A representação da entidade no maranhão será coordenada por Jhonatan Almada, secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação. O núcleo terá entre as prioridades discutir temas internacionais relacionados à luta contra o Imperialismo; apoio aos povos que lutam por sua independência, a exemplo dos palestinos; pelo desarmamento global; contra as intervenções militares, entre outras.
São Luís, 19 de Novembro de 2016.