Se nenhum fato vier a reverter o que está programado nos bastidores da política, a partir da próxima sexta-feira (23), o deputado federal Waldir Maranhão (PP), atual 1º vice-presidente da Câmara Federal, em torno de quem giram denúncias, suspeitas e controvérsias, fortalecerá seu cacife político como eminência parda no braço maranhense do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Isso se dará com a demissão da atual superintendente Kátia Bogéa, por ele articulada, e que será substituída por Alfredo Costa, atual subsecretário das Cidades, indicado pelo parlamentar. A mudança de comando no Iphan do Maranhão foi armada em Brasília, num jogo do parlamentar com o Palácio do Planalto, em troca do seu apoio a um pacote que inclui salvar a pele do presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ), bagunçar o processo de impeachment, apoiar os vetos da presidente Dilma Rousseff (PT) e votar e pedir votos a favor da do ajuste fiscal.
A troca de comando no Iphan poderá produzir um enorme leque de mudanças, algumas com teor capaz de causar graves danos à política de preservação do patrimônio histórico e artístico do Maranhão, notadamente em São Luis. Isso porque quebrará uma linha de trabalho que, sob o comando da diretora Kátia Bogéa, funcionária de carreira da autarquia, vem se mostrando competente, produtiva e independente, desde o final dos anos 90 do século passado. Essa orientação, que resultou em muitos ganhos na seara do patrimônio cultural do Maranhão, sobreviveu, por mérito, ao segundo governo de Roseana Sarney (1999/2012), aos cinco anos de José Reinaldo Tavares, aos dois anos e meio de do governo Jackson Lago, mais cinco anos de governo de Roseana Sarney e aos primeiros nove meses do governo Flávio Dino, o que elimina qualquer dúvida quanto o seu desempenho competente.
Hoje, a maior força do Iphan está concessão de licenças ambientais e no poder de fiscalização, pois são atividades que movimentam milhões, que são revertidos em obras de preservação do patrimônio cultural. Nenhuma construção, principalmente de médio e grande porte, pode ser feita sem licenciamento, que têm custo financeiro elevado, sob pena de as empresas arcarem com multas salgadas. Há quem avalie que em mãos erradas, o Iphan é uma tentação para desvios.
A queda de Kátia Bogéa começou a ser desenhada quando ela intensificou a fiscalização em projetos de construção em todo o estado, procurando identificar e preservar o que pudesse ser definido como patrimônio cultural, como sítios arqueológicos. Um exemplo do seu trabalho ocorreu o desmatamento e terraplanagem feita na área da Refinaria Premium I, em Bacabeira. O Iphan identificou a destruição de vários sítios arqueológicos e multou a Petrobras em R$ 11 milhões. Depois de uma peleja processual, a Petrobras reconheceu o “crime” e programou o desembolso de R$ 11 milhões, dinheiro com o qual a UFMA vai restaurar o prédio ao antigo Sioge para implantar ali um museu para exibir as peças encontradas na área desmatada.
Nesse contexto, várias empresas de construção civil que atuam no filão do Minha Casa, Minha Vida atropelaram a regra e foram pesadamente multadas pelo Iphan. Insatisfeitos, alguns empresários montaram um lobby e procuraram o deputado Waldir Maranhão, a quem relataram as pesadas multas e pediram mudanças no Iphan do Maranhão, incluindo a demissão de Kátia Bogéa. Encantado com o mundo que se abria à sua frente, Waldir Maranhão articulou e o resultado dessa ação foi um telefonema, na semana passada, da Casa Civil da Presidência da República, comunicando-a que seria demitida. Outras forças, incluindo o ex-presidente José Sarney, tentaram manter Kátia Bogéa no cargo – o Palácio dos Leões não se envolveu -, mas Waldir Maranhão levou a melhor.
Tão logo confirmou seu domínio sobre o Iphan no estado, o deputado Waldir Maranhão cuidou de indicar o substituto de Kátia Bogéa na superintendência do órgão. Não se sabe ainda por quais motivos, indicou o atual subsecretário de Estado das Cidades, Alfredo Costa, oriundo de Carolina, onde existe um expressivo acervo de casarões coloniais e itens do patrimônio cultural. A mudança de comando – que está deixando perplexa a comunidade cultural e até mesmo o meio político – está marcada para sexta-feira que vem, dia 23 de outubro.
PONTOS & CONTRAPONTOS
Um bom trabalho
Funcionária de carreira do Iphan, Kátia Bogéa deixa a Superintendência do órgão no Maranhão depois de uma gestão longeva, mas de alto nível, produtiva e respeitada. Durante esse período, ela realizou um trabalho visível em São Luís, mas alcançando também cidades nas quais existem acervos arquitetônicos e manifestações culturais importantes. Sob sua gestão, São Luís foi tratada como Cidade Patrimônio Cultural da Humanidade – o título chegou antes da sua gestão, mas sob ela a Capital foi respeitada como tal. Técnica e burocraticamente exigente, ela contribuiu decisivamente para o reconhecimento do Bumba-boi, do Tambor de Crioula e da Festa do Divino como patrimônios imateriais do Brasil, e para a preservação do patrimônio arquitetônico de São Luís e Alcântara, como também brigou intensamente pelo respeito à regra do licenciamento ambiental, de modo a proteger sítios arqueológicos, principalmente na Ilha de São Luís. Vigilante e exigente no exercício do cargo, ela comprou boas brigas, algumas delas com a então governadora Roseana Sarney, ora levando a melhor, ora perdendo, mas sempre em defesa de boas causas. Quase duas décadas é muito tempo para um agente público permanecer num cargo dessa natureza. Em circunstâncias normais, sua substituição causaria impacto bem menor. Mas ser demitida por articulação do deputado federal Waldir Maranhão foi no mínimo incômodo.
Nuvens de dúvidas
Depois de começar a semana sob intenso bombardeio, principalmente de alguns segmentos da imprensa nacional, para os quais sua condição de 1º vice-presidente da Câmara Federal é um absurdo, principalmente pelas ações que o envolvem na Justiça – seu mandato é garantido por uma liminar da Justiça Eleitoral, o deputado federal Waldir Maranhão chega ao fim da semana como um parlamentar muito mais poderoso. A pedido de empresários da construção civil – quase todos tocam projetos do Minha Casa, Minha Vida -, ele articulou a mudança na direção do Iphan no Maranhão desmontando uma gestão que vinha dando certo e era respeitada todos. O que lhe disseram os empresários? Que tipo de acordo político foi feito? Como será a nova gestão vai agir diferentemente da atual? Será flexível com uma regra – a do licenciamento – que tem de ser implacável? São perguntas que estão sendo feitas. Até aqui, nada desabona a conduta do futuro superintendente, Alfredo Costa, mas o simples fato de ser indicado pelo deputado Waldir Maranhão infelizmente o coloca sob o nevoeiro dúvidas que paira sobre a cabeça do patrono. No mais é torcer para que seja uma gestão correta e produtiva como foi a que termina na próxima sexta-feira.
São Luís, 16 de Outubro de 2015.