Quando, em setembro do ano passado, às vésperas de viajar para o Maranhão, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), numa entrevista à Jovem Pan – a mais agressiva cidadela bolsonarista do rádio brasileiro -, disse que não cumpriria a agenda prevista para Balsas porque o governador Flávio Dino (PCdoB) havia proibido a Polícia Militar de participar do esquema da sua visita ao município, não tinha ideia de que a falácia lhe daria forte dor de cabeça. Ao tomar conhecimento da declaração, o governador a classificou de “mentirosa” e decidiu entrar na Justiça contra o presidente por calúnia. O assunto foi notícia em todo o País, e logo foi constatado que, por motivo ainda não esclarecido, o presidente da República faltou com a verdade e, o que é pior, não se retratou diante da reação inicial do governador. E como havia anunciado, dias depois o mandatário maranhense protocolou uma notícia-crime no Supremo Tribunal Federal, na qual acusa o presidente Jair Bolsonaro de caluniá-lo, demonstrando que o que o chefe da Nação declarara à Jovem Pan era mentira. No meio político e fora dele, muitos achavam que o caso, como outros dessa cepa, estava condenado a desaparecer nos arquivos da Corte maior. Mas ontem, o decano do Supremo, ministro Marco Aurélio Mello, cumpriu a regra e encaminhou a notícia-crime à Câmara dos Deputados, para que a Casa autorize ou não a abertura de processo contra o presidente da República.
Se o novo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), fizer a parte que lhe cabe sem manipulação, a notícia-crime de Flávio Dino contra Jair Bolsonaro cumprirá os trâmites normais até chegar ao plenário da Casa, onde será submetida ao voto. Se 342, ou seja, 2/3 dos deputados federais concordarem, a denúncia será devolvida ao Supremo, que por sua vez abrirá processo. Nesse caso, vem o mais grave: Jair Bolsonaro terá de se afastar da presidência da República até que a ação seja julgada. Se isso ocorrer e ele for condenado, deve perder o cargo. Mas se, ao contrário, o pedido não alcançar os 2/3 de votos favoráveis, o processo será devolvido ao Supremo para ser devidamente arquivado.
Independentemente do que venha a acontecer de agora por diante, a iniciativa do governador Flávio Dino de denunciar o presidente Jair Bolsonaro por atacá-lo recorrendo a uma mentira já terá pelo menos servido para alertar a Câmara dos Deputados sobre o mau hábito do presidente da República. Nos fundamentos da notícia-crime, o governador questiona: “A mentira pode ser usada deliberadamente no debate político? O Presidente da República, com suas elevadas atribuições, pode costumeiramente mentir? ” Dois questionamentos diretos e muito claros que os deputados federais, incluindo os 18 da bancada maranhense, terão de responder. Se os 342 votos necessários autorizarem a abertura do processo pelo Supremo, esses deputados estarão dizendo à sociedade brasileira que não concordam que o presidente da República, seja ele quem for, use a mentira para atacar um governador de Estado, ou quem quer que seja, independentemente de ser ele adversário, aliado ou politicamente neutro. Mas se esses 2/3 da Câmara dos Deputados negarem a autorização, estarão dizendo para a sociedade brasileira, para seus eleitores, que aprovam que o presidente da República minta, declarando-se, portanto, coniventes com a mentira presidencial, abrindo com essa posição um precedente muito grave para a confiabilidade das instituições brasileiras, à medida que desrespeitam flagrantemente o artigo 85 da Constituição da República.
De qualquer maneira, a Câmara dos Deputados, tome a decisão que tomar, terá conhecimento de que o presidente da República está sendo denunciado por um governador de Estado como mentiroso, o que, além de constrangedor, coloca em xeque a honorabilidade necessária para quem exerce o cargo de presidente da República.
Ex-juiz federal e ex-deputado federal, o governador Flávio Dino agiu como qualquer autoridade e cidadão responsável teria de agir: bateu às portas da Suprema corte cobrando justa reparação diante da atitude nada responsável do presidente Jair Bolsonaro de acusá-lo, injusta e criminosamente, de proibir a Polícia Militar de garantir segurança ao chefe da Nação em visita ao Maranhão. Como se vê, uma acusação sem pé nem cabeça, provavelmente feita para justificar sua decisão de não atender ao pedido do senador Roberto Rocha (PSDB) de ir a Balsas, como havia prometido.
Com a palavra, agora, os deputados federais.
PONTO & CONTRAPONTO
Jaques Wagner enxerga bom senso político em Flávio Dino
A entrevista do senador Jaques Wagner (PT-BA) ao jornal Folha de S. Paulo avaliando a posição do seu partido para a corrida presidencial do ano que vem mostrou que, mesmo dentro do PT, o governador Flávio Dino é nome de peso na seara da chamada esquerda democráticas. Indagado sobre qual perfil mais lhe agrada entre os nomes postos hoje nesse segmento, Jaques Wagner citou o governador baiano Rui Costa (PT), o cearense Camilo (PT) e o piauiense Wellington Dias (PT) como nome a serem levados em conta, e que, fora do PT, Ciro Gomes é um bom nome, mas está fazendo uma política de isolamento em relação ao PT, e fechou assinalando que o maranhense Flávio Dino (PCdoB) é um nome que aparece com mais frequência nas conversas sobre a definição de um candidato para enfrentar o presidente Jair Bolsonaro.
A ênfase dada por Jaques Wagner ao citar Flávio Dino é reveladora de que o governador maranhense é visto com olhar diferenciado quando o assunto é sucessão presidencial. Um dos líderes petistas mais respeitados, exatamente pelo viés mais aberto da sua ação política, Jaques Wagner defende, como Flávio Dino, a ideia da grande aliança, que vozes petistas graúdas, a começar pelo próprio ex-presidente Lula da Silva, se esforçam para não concordar. Ele sabe que boa parte da cúpula petista fará de tudo para lançar um candidato do próprio partido, baseada na convicção de que a esquerda embarcará. Na avaliação de Flávio Dino, e que parece ser a de Jaques Wagner, esse projeto é “suicida”, e pode favorecer a Jair Bolsonaro.
Esse conflito de visões está levando Flávio Dino a amadurecer o projeto de disputar a senatoria, o que, já está muito claro, será muito mais saudável para ele e para a realidade política do Maranhão. Exatamente por não ser uma aventura.
Procurador Geral de Justiça quer rigor na fiscalização das medidas contra o novo coronavírus
Se depender do procurador geral de Justiça, Eduardo Nicolau, todas as medidas previstas no Decreto Nº 36.531/21, editado pelo governador Flávio Dino para conter o avanço do novo coronavírus no Maranhão, serão cumpridas à risca, por meio de uma fiscalização rigorosa e eficiente. Esse posicionamento foi por ele exposto de maneira enfática durante reunião realizada quinta-feira, na sede do Ministério Público com a participação de várias promotorias e da Secretaria de Segurança Pública.
– Esse é o pior momento que já enfrentamos e precisamos agir com firmeza para garantir a vida do nosso povo – declarou o chefe do Ministério Público do Maranhão. Ele justificou a firmeza que os órgãos e os agentes fiscalizadores devem usar nas suas operações lembrando a gravidade da situação hospitalar do Estado, que depois de um período de queda nos números de óbitos e de infectados, uma reviravolta reativou a curva de crescimento, ameaçando a estrutura hospitalar dedicada a doentes de Covid-19, com a ocupação de leitos rondando os 100%.
Com larga experiência em ações fiscalizadoras e com amplos conhecimentos na área criminal quando promotor de Justiça, o procurador geral Eduardo Nicolau sabe o que diz quando defende ações fiscalizadoras rigorosas. E quem o conhece sabe que ele costuma jogar pesado quando encara desafios como o de agora.
São Luís, 06 de Março de 2021.